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O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado da Bahia (Faeb), Humberto Miranda, avalia que a questão da infraestrutura no Estado é um dos principais problemas que impedem o desenvolvimento do setor. Em entrevista à Tribuna, entre outros problemas, ele aponta a questão da energia elétrica como um dos principais fatores. “Na região Oeste da Bahia, se chegar uma fábrica de tecelagem, por exemplo, têm regiões que não têm capacidade de energia para mover uma fábrica. Ainda falta energia em alguns lugares. No Semiárido, temos a energia monofásica do programa Luz Para Todos. Se o pequeno produtor quiser colocar uma bomba para irrigar meio hectare de cultura, não tem capacidade porque a energia não é capaz de rodá-la”, destaca. Ele também aponta que os problemas de Segurança Pública impedem o homem de viver no campo. “Têm regiões do Estado onde as pessoas não podem morar no campo, porque a insegurança chegou com força. Drogas, roubos… Roubos de animais. Em qualquer região do Estado que você chega tem verdadeiras quadrilhas roubando animais, além de roubo de máquinas”, ressalta. Miranda também defende que exista um modelo de educação voltada para alunos do campo, já que as escolas ainda trabalham com um modelo que apenas mostra oportunidades no mundo urbano.

Tribuna – Qual é o diagnóstico do setor agrícola e agropecuário na Bahia hoje? Foram muito impactados com a pandemia que vivemos nos últimos dois anos? 

Humberto Miranda -  Essa é uma longa pergunta. Vou tentar resumir. A questão da pandemia afetou o mundo inteiro, todos os setores e dizimou muitas vidas, abalando a economia de praticamente todos os setores. Se teve um setor que precisava continuar trabalhando, gerando emprego, renda e oportunidades foi o setor agropecuário – até porque não podia faltar alimento para a população que estava dentro de casa por bastante tempo por questões necessárias de proteção da vida naquele momento. Mas o setor agropecuário obedeceu a todas as regras de segurança da OMS, continuou trabalhando e seguindo as normas. O setor conseguiu atravessar a pandemia e crescer. Isso é importante: mesmo durante a pandemia, o setor cresceu e deu resultado. O grande prejuízo que a pandemia deu foi o aumento dos insumos em virtude do fechamento de muitas fábricas, de muitos postos de indústrias que são necessárias. Isso impactou no custo de produção e na falta de alguns produtos para que o setor continuasse trabalhando. A gente conseguiu ir se adequando graças à inovação. Quanto ao panorama, o setor agropecuário tem na Bahia um panorama animador. Temos crescido. A Bahia bateu em 2021 a produção de grãos em 10 milhões de toneladas. Esse ano devemos bater recorde novamente, passando de 11 milhões. Somos uma indústria a céu aberto e as chuvas têm sido generosas. Culturas generosas, como café, feijão e milho têm crescido. O panorama é animador e a gente espera de 2022 fechar com recorde de produção de grãos. E com as frutas, que também têm um panorama animador no setor internacional.

Tribuna – O que o setor têm de mais carências hoje? Qualificação? Infraestrutura? Incentivo do governo? 

Humberto Miranda -  Nossos principais gargalos na Bahia são de infraestrutura, primeiro. A incapacidade de energia elétrica. Na região Oeste da Bahia, se chegar uma fábrica de tecelagem, por exemplo, têm regiões que não têm capacidade de energia para mover uma fábrica. Ainda falta energia em alguns lugares. No Semiárido, temos a energia monofásica do programa Luz Para Todos. Se o pequeno produtor quiser colocar uma bomba para irrigar meio hectare de cultura, não tem capacidade porque a energia não é capaz de rodá-la. Falta também conectividade para levar educação, saúde e qualificação para o produtor. Principalmente na zona rural, no campo… E conectividade hoje é um insumo que gera oportunidade e a igualdade para as pessoas poderem ter acesso a conhecimento e informação. É inconcebível não ter uma cobertura no Estado. E aí a gente vai para as estradas, seja as BRs ou as BAs que não são duplicadas. Isso encarece o trânsito e aumentam os riscos. Temos hoje uma projeção de que, desde a saída do campo até o mercado, se perde em torno de 20% de produção. O cara colhe 10 caixas de tomate e apenas 8 chegam ao supermercado em condições de venda. Isso é uma perda muito grande. Isso é graças ao custo de transporte e as condições das estradas. E também têm portos e aeroportos, já que temos os maiores custos em ambos. Parte dos grãos do Oeste vão ser embarcados em portos do Maranhão ou de Santos, em São Paulo. A questão da infraestrutura é um gargalo enorme. E também temos o problema da Segurança, na questão mais ampla da palavra. Têm regiões do Estado onde as pessoas não podem morar no campo, porque a insegurança chegou com força. Drogas, roubos… Roubos de animais. Em qualquer região do Estado que você chega tem verdadeiras quadrilhas roubando animais, além de roubo de máquinas. E também a insegurança jurídica. A Bahia é um dos estados com mais invasões de propriedades por índios, quilombolas, sem-terra… A gente pede para o setor que se use a lei. A gente não quer usurpar direitos. O produtor tem o título da sua terra, uma cadeia sucessória, passando de famílias, comprando, tudo registrado e, de uma hora para outra, o cara aparece dizendo que é dono. A nossa missão maior também é a questão da assistência técnica. Hoje temos mais de 700 mil produtores e quase 90% são pequenos e que necessitam de informação e qualificação. Infelizmente, isso impede o desenvolvimento dos pequenos negócios. Os grandes vão crescendo, porque têm acesso a tecnologia, e os pequenos vão ficando para trás. Apesar dos problemas, é um setor que ainda consegue crescer e gerar 30% dos empregos no Estado. Mais da metade de tudo que a Bahia exporta sai do setor agropecuário. Nós chegamos a 27% do PIB da Bahia no primeiro semestre. Um PIB de mais de R$ 300 bilhões e o setor corresponde a quase 30% disso.

Tribuna – A inflação que a gente tem visto no Brasil tende a afetar os produtores? Temos ouvido de distribuidores que as vendas têm caído. Isso pode afetar os produtores também, né? 

Humberto Miranda -  Sem dúvida. Agora, o que mais tem nos afetado são os reflexos pós-pandemia e pós-guerra, agora com esse conflito da Rússia com a Ucrânia – que fechou os principais portos do Oriente Médio e impede a importação de insumos, como adubos e fertilizantes, para que o Brasil possa produzir. Isso encareceu muito. Temos um levantamento feito pela Federação da Agricultura na região Oeste que mostra que o custo de produção subiu quase 300% nos últimos 10 anos. Se você gastava 10 reais para produzir, hoje gasta três vezes mais. Tudo isso é repassado para o preço dos produtos. Ainda bem que esses produtos de lá são commodities, vão para o mercado internacional e conseguem pagar isso. Mas outros produtos da agricultura familiar, como tomate e feijão, tiveram um aumento significativo. O leite subiu muito agora, porque o custo subiu três vezes mais. Isso tem impactado no mercado, no preço das prateleiras e que pressionam a inflação. Isso é uma questão de regulação de mercado que as políticas públicas precisam agir em defesa.

Tribuna – Nós estamos em ano eleitoral. A FAEB enxerga em algum dos candidatos propostas interessantes para ajudar os produtores? 

Humberto Miranda -   A posição política nossa é de proposição. Fazemos as críticas, mas propomos soluções. Fizemos um debate com os principais candidatos a governador e entregamos a cada um deles a necessidade que o setor precisa para continuar produzindo e gerando renda. A nossa posição com os candidatos a governador, principalmente com os três primeiros colocados [ACM Neto, Jerônimo Rodrigues e João Roma], é de proatividade. Levar para eles o caminho que achamos seguro, que é o do desenvolvimento. Inclusive, a principal proposta nossa é que tenhamos uma mesa de negociação contínua do setor produtivo com o governo. Queremos um diálogo contínuo para que a gente possa discutir. O setor é dinâmico. O que estou falando aqui hoje, daqui seis meses, pode não ser mais as principais demandas. É preciso atualizar.

Tribuna – Quantos produtores hoje são atendidos pela FAEB? 

Humberto Miranda -   No ano de 2021, que é o que nós temos fechado, atendemos 170 mil – entre pequenos produtores, trabalhadores rurais e alunos. Quero fazer uma consideração, porque existem duas coisas fundamentais para continuar crescendo em qualquer setor. O primeiro é a educação. Precisamos discutir um modelo de educação que tenha um contexto com a atual necessidade da Bahia e do setor agropecuário. Precisamos ter um sistema de educação rural. A gente tem uma educação muito voltada para o urbano, que não mostra as oportunidades que temos no setor rural. O segundo é que não podemos nos afastar da academia, do conhecimento e da pesquisa. Precisamos continuar pesquisando formas de gerar produtos e oportunidades melhores para o campo.