Acusado de racismo contra uma professora negra durante aula na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), na cidade de Cachoeira, o estudante do curso de Ciências Sociais, Danilo Araújo de Góis, disse que não pegou a prova da mão da docente por “questão de energia”. Ele foi ouvido na manhã desta quinta-feira (12) na Central de Flagrantes, em Salvador.

Após a repercussão do caso, Danilo deixou de frequentar as aulas, abandonou a residência estudantil, onde morava em São Félix e foi hostilizado, e não é mais encontrado pela universidade e por outros estudantes. Na manhã desta sexta-feira, Danilo foi localizado pelo delegado titular de Cachoeira e São Félix João Mateus e por um professor da UFRB na Estação Rodoviária de Salvador.

Um vídeo que circula nas redes sociais mostra o momento em que o universitário de camisa vermelha, sentado com uma mala e uma sacola e conversando com o delegado e com o professor José da Conceição Santana, de Gestão de Cooperativas da UFRB. “Estou de férias, mas como moro aqui, fui informado de que ele estaria na rodoviária. Então, como precisámos ouvi-lo, resolvi eu mesmo ir até ele e contei com a ajuda de um professor da instituição”, explicou João Mateus.

Veja:

A reportagem tentou falar com a professora de História Isabel Reis, mas não conseguiu. A UFRB informou que instaurou um processo disciplinar nesta quarta-feira (11) para apurar a denúncia de racismo imputada ao estudante. A penalidade vai de suspensão a expulsão. Segundo a universidade, Danilo tentou entrar na universidade através de cotas raciais. Ele se autodeclarou preto ou pardo, mas teve o pedido indeferido pela banca avaliadora.

Depoimento

Danilo chegou à Salvador por volta das 9h30 e depois já estava na Central de Flagrantes, na Avenida Tancredo Neves, do outro lado da estação, onde foi ouvido por um delegado de plantão. No entanto, Danilo conversou informalmente com o delgado João Mateus. O universitário negou que tenha praticado racismo contra a professora.

“Numa conversa a caminho da delegacia, ele alegou que tudo não passou de um mal entendido, que nada tinha a ver com questões raciais, que na verdade era uma questão religiosa, uma questão de energia, que desenvolveu uma sensibilidade e não se sente bem em lidar com outras pessoas que não sejam de seu convívio pessoal e que por isso não recebe objetos, por conta da energia e que passa mal, sente dores nos olhos, que isso não tem nada a ver com a condição racial”, contou o delegado. Danilo foi acusado pela professora de História Isabel Reis, que é negra, de ter cometido racismo ao recusar pegar das mãos dela uma avalição.

“Ele disse que pediu para que ela colocasse o papel na mesa por conta da energia. Em depoimento na delegacia de Cachoeira, a professora entendeu que foi atitude racista e foi instaurado inquérito para tal situação. Por isso estamos apurando. Inclusive, na semana passada, segundo ele, aconteceu a mesma situação com outra professora, que não é negra. Ele se recusou a pegar um papel das mãos dela porque é sensitivo. Ele diz que tem uma posição diferenciada, que não é racista”, relatou o delegado.

Segundo o delegado, Danilo disse que é cristão, mas que recentemente tem frequentado uma Igreja Presbiteriana. Danilo prestou depoimento por uma hora e meia na Central de Flagrantes e recebeu uma guia de exame de corpo e delito. Segundo o delegado, o universitário não disse para onde iria, mas que, ao que tudo indica, não pretendia retornar à Cachoeira. “Diante da situação, é muito improvável. Ele disse que estava sendo ameaçado, inclusive havia registrado um boletim de ocorrência em São Félix, onde residia”, contou. Danilo é natural de Sorocaba, em São Paulo.

Processo

Danilo se recusou na noite de segunda-feira (9) a receber um documento das mãos da professora na sala de aula. Em um vídeo que circula nas redes sociais, a docente diz: “Não estou entendendo?”. E o estudante, estático em frente à mesa, indica com o dedo para que ela deixe o papel sobre a mesa. Segundo alunos do curso de Ciências Sociais da UFRB, o colega de sala agiu dessa forma porque a docente é negra. A URFB instaurou um processo disciplinar que poderá resultar na expulsão de Danilo da instituição.

O procedimento é acompanhado por uma comissão formada por professores e alunos que deve ouvir a professora, Danilo e testemunhas. O resultado deve sair em 30 dias. Ainda de acordo com a instituição, devido às circunstâncias, foi instaurado também um termo de acautelamento – documento que possibilita que o estudante possa estudar fora da sala de aula, tendo em vista a necessidade da preservação de sua integridade física, bem como de colegas de sala.

Segundo o Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA), como o inquérito policial ainda não foi concluído, o caso não foi enviado ao órgão. Quando o trabalho da policia for concluído o caso deve ser acompanhado, no MP, pelo promotor Rodrigo Rubiale, de Cachoeira. A confirmação do nome do promotor, contudo, só acontecerá quando o órgão der início aos trabalhos. Correio da Bahia