Primeira correligionária a relatar a existência de um esquema de candidaturas laranjas do PSL em Minas Gerais, a deputada federal Alê Silva revela ter recebido a informação de que o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, a ameaçou de morte em uma reunião com outros membros do partido, no final de março, na capital Belo Horizonte. A revelação da parlamentar foi feita em entrevista à Folha de S. Paulo, mas ela prestou depoimento espontâneo à Polícia Federal (PF) em Brasília, na quarta-feira (10).

“É pesado [o relato que recebeu]. Acredito que foi uma ameaça contra minha vida e a vida da minha família. De que minha vida correria risco, se eu levasse adiante isso. Sabia que iria correr esse risco, estou pagando o preço, mas não ia aceitar ficar submissa às ordens de pessoas que agem de forma que eu condeno, desviando recursos públicos”, ressalta a deputada, que pediu proteção policial. Ela conta que ouviu o relato no último dia 1º, em seu escritório político de Ipatinga, na região do Vale do Aço, em Minas.

De acordo com a parlamentar, um político do PSL do estado, que teria se reunido com o ministro no fim de semana anterior, foi de carro até sua cidade para relatar o ocorrido pessoalmente e não por telefone. “Ele disse para eu parar, esquecer esse assunto, não levar isso adiante porque senão a minha vida e a da minha família correria risco”, contou. “Essa pessoa me disse que ele falou assim: ‘Eu vou parar a minha vida para acabar com a vida dela'”.

Além disso, Alê relata que está sofrendo retaliações por parte do ministro, pois soube por colegas que ele “rasgou” as indicações que ela fez para a composição de comissões estaduais do partido em cidades mineiras.

Mas ela não é a única que se sentiu ameaçada diante da situação. Segundo informações da Folha de S. Paulo, uma das denunciantes já ouvidas é Cleuzenir Barbosa, que foi candidata a deputada estadual. Ela lembra que se sentiu ameaçada em reunião com um assessor de Álvaro Antônio porque teria colocado uma arma sobre a mesa durante a conversa.

Segundo informações do jornal, o ministro nega ter feito ameaças e diz que Alê faz campanha difamatória contra ele, a fim de obter espaço no diretório estadual do partido — na época da eleição, ele era o presidente da sigla em Minas Gerais. Além disso, desde que o caso do laranjal foi divulgado pelo jornal, no início de fevereiro, o ministro nega as acusações, investigada pelas Polícia Federal (PF) e pelo Ministério Público de Minas.

Para ele, a deputada age dessa forma, pois se sentiu prejudicada com sua ida para o ministério, o que levou o suplente Enéias Reis para sua vaga na Câmara. “Esse fato garante ao agora deputado Enéias Reis a prerrogativa de indicar a comissão do PSL nesses municípios, inclusive na terra natal dela, Coronel Fabriciano, e tira da deputada esse poder”, disse o ministro, acrescentando.

“É incompreensível que uma briga partidária municipal fique ganhando espaço na mídia nacional e, o pior, criando factoides e dando desnecessário trabalho a instituições sérias, ocupadas e comprometidas, como é a Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça”.

De fato, a Folha fez uma série de reportagens em que aponta que Álvaro Antônio teria patrocinado um esquema de candidaturas de mulheres que receberam altas quantias do partido, porém não deixaram qualquer sinal de campanha. De acordo com o jornal, parte desse dinheiro foi parar em empresas ligadas a assessores de seu gabinete na Câmara Federal, onde ele exercia seu mandato como deputado desde 2008.

Alê disse ao jornal que descobriu o esquema após a eleição, com base em relatos de políticos do partido no estado e de pesquisa nos dados da prestação de contas das candidatas que eram apontadas como de fachada.

Ela, então, encaminhou todo o material colhido para a Associação Patriotas em Foco, de sua cidade — ela mora em Coronel Fabriciano, também no Vale do Aço —, e a entidade fez uma representação ao Ministério Público, isso ainda antes da primeira reportagem da Folha ir ao ar.

“Prometi na vida pública combater a corrupção e jamais iria me calar diante do surgimento de um foco de corrupção tão perto de mim. Senti-me na obrigação de levar os fatos ao conhecimento do Ministério Público. No início me mantive em silêncio por receio da reação dos envolvidos. Agora vieram sérias ameaças, que se concretizaram através de interlocutores do ministro”, afirma.

Até o momento, quatro candidatas do partido em Minas afirmaram aos investigadores que foram usadas ou receberam propostas para serem laranjas. Outras quatro são investigadas sob suspeita de participação no esquema. Com isso, a PF vê indícios de participação de Álvaro Antônio na fraude.

Alê acredita, no entanto, que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) não tenha conhecimento. “Não acredito em envolvimento do Bolsonaro em tudo isso. Acredito que ele foi tão vítima como eu. Foi e está sendo tão vítima como eu por ter acreditado na pessoa errada”, defende. O presidente diz que decidirá sobre a permanência ou não do ministro quando a investigação chegar ao fim. Foto: Valter Campanato / Agência Brasil