Ao olhar para o índice de violência contra a mulher, os números apontam que a vida das baianas está constantemente em risco. “Esse é o castigo para aquelas que não atendem às expectativas depositadas nelas – em geral pelos parceiros e ex-parceiros ou que simplesmente são objetificadas”, cita o relatório ‘Elas Vivem: dados da violência contra mulher’.

Em 2021, na Bahia, foi registrado um caso de violência contra a mulher a cada dois dias. O estado ocupa o quarto lugar no índice nacional de vítimas, de acordo com o levantamento da Rede de Observatórios da Segurança, responsável pela pesquisa. Os três com mais registros são: São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco.

Do total registrado no ano passado, a Bahia teve 66 feminicídios, 50 agressões e tentativas de feminicídios e 29 estupros. Outros quatro tipos de violência contra a mulher ainda foram denunciados: 55 homicídios, 13 tentativas de homicídios, 7 torturas, cárceres privados e sequestro, 6 agressões verbais e ameaças. Somando os casos de balas perdidas e os considerados como outros, 232 eventos de violência foram contabilizados.

Luciene Santana, pesquisadora da Rede de Observatórios da Segurança e da Iniciativa Negra na Bahia, explica que a cultura machista é o principal motivador desse cenário. “Primeiro que a violência contra a mulher é algo construído culturalmente, por isso, os índices ainda são tão altos. Violência contra mulher está em terceiro lugar em quantidade, atrás apenas de casos de policiamento e eventos envolvendo armas de fogo”, explica.

Quando a motivação dessas agressões e mortes são informadas, as três maiores causas apontadas são brigas (28%), término de relacionamentos (9%) e ciúmes (8%). Boa parte dos crimes contra mulheres divulgados (85%) não traz a informação racial da vítima. Mas, ao considerar os casos em que a cor da mulher é informada, 50,7% delas são negras, 48,6% brancas e 0,7% indígenas.

Em 65% dos casos de feminicídios e em 64% dos casos de agressão, os autores dos crimes são os companheiros das vítimas. “As mulheres têm medo de denunciar, pois muitas têm filhos ou dependem financeiramente do companheiro. Em alguns casos, muitas ainda têm medo da família, do julgamento dos vizinhos e amigos. Sentem medo de serem colocadas como culpadas”, explica Luciene.

De acordo com a presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB/BA, Daniela Portugal, a Lei Maria da Penha prevê, dentre as medidas protetivas de urgência, a possibilidade de fixação de alimentos provisórios para as vítimas economicamente vulneráveis, mas não é o que ocorre na prática.

“Grande parte dos magistrados se recusa a aplicar a medida, sob o argumento de que estariam invadindo a competência das Varas de Família. Com a recusa dos magistrados, fica praticamente impossível para uma mulher que depende economicamente do agressor, romper o ciclo de violência”, destaca Daniela.

Em relação a 2020, houve uma queda de 31% nos registros da Rede de Observatórios da Segurança, na Bahia. Porém, ao analisar os tipos de violência sofridas por essas vítimas, não há grande variação quando se trata de feminicídio: foi de 70 em 2020 para 66 casos em 2021.

Para Daniela Portugal, “ainda que as pesquisas mais recentes tenham apontado certa diminuição nos números de feminicídio na Bahia, a quantidade de casos ainda é muito alta e as medidas de prevenção ainda são insuficientes. Há uma resistência em se aplicar, na íntegra, os dispositivos da Lei Maria da Penha”, explica.

Segundo a presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB/BA, para as vítimas, o apoio do estado ainda parece insuficiente, pois, a Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam) conta com poucas unidades e os núcleos de atendimento não acolhem a complexidade e a gravidade dos casos.

A reportagem procurou a Secretaria da Segurança Pública da Bahia (SSP), na tarde de ontem, para maiores esclarecimentos, mas até a publicação desta matéria, não houve retorno. Correio da Bahia