A cobertura vacinal das pessoas a partir de 12 anos com a segunda dose ou dose única anticovid na Bahia é, atualmente, de 77,9%. Mas a média esconde uma grande desigualdade. Enquanto 59 municípios já passaram dos 90%, 28 ainda nem chegaram aos 50%. O ranking negativo de menor cobertura é ocupado por Mutuípe, Varzedo e Encruzilhada, do primeiro ao terceiro lugar, respectivamente. O levantamento foi obtido pelo Conselho Estadual de Saúde da Bahia (CES-BA) via Secretaria da Saúde do Estado (Sesab).

Salvador tem 89,75% de cobertura vacinal para a primeira dose. Para a segunda, entre pessoas com 12 anos ou mais, o número é 77,43%. Mas quem lidera na maior cobertura é Uauá, com 95,15% para a primeira dose e 137, 17% para a segunda. O número acima dos 100% pode ser explicado pela margem de erro na estimativa populacional (baseada no último Censo do IBGE, de 2010) e também pela aplicação de vacina para pessoas de outros municípios.

Já Mutuípe fica com apenas 40% de cobertura para a primeira dose e 20,83% para a segunda. Para a população entre 5 a 11 anos, o sistema não aponta nenhuma vacina aplicada, assim como acontece com a dose de reforço. Além de Mutuípe, Varzedo e Encruzilhada, também integram a lista dos 28 municípios cidades como Amélia Rodrigues, Teixeira de Freitas e até mesmo Ilhéus.

“Não adianta termos Salvador com quase 90% da população vacinada e outras com menos de 50%. Para a Bahia ficar livre da covid-19, com um cenário positivo, a gente precisa equiparar a vacinação”, defende o presidente do Conselho Estadual de Saúde da Bahia (CES-Ba), Marcos Sampaio.

“Quando fazemos uma análise por macrorregião da Bahia, observamos percentuais diferentes de uma para outra. O Extremo-Sul tem o menor percentual de cobertura, com 66,8%. Depois, vem o Sul com 69,9%. A melhor cobertura é a do Centro-Norte, com 85,4%”, afirma Vânia Rebouças, coordenadora do Programa Estadual de Imunizações da Sesab.

O presidente do CES-Ba destaca que o principal fator para a desigualdade é a falta de profissionais em uma parte dos municípios. “Há falta de vacinadores e digitadores. Em alguns municípios, a equipe é insuficiente para vacinar e colocar no sistema”, diz. O CES-Ba enviou, no último 4, um ofício ao Ministério da Saúde solicitando recursos extras para a contratação de mais profissionais para a vacinação. Ainda não houve resposta.

Sampaio ainda acrescenta que há desigualdades entre zonas urbanas e rurais e atrasos no sistema. “Tem também o problema da zona rural, das grandes distâncias a serem enfrentadas, dos obstáculos nesses caminhos a serem percorridos. Mas vale ressaltar as falhas no sistema. Há um atraso nisso. Alguns municípios não têm suporte, outros têm dificuldade com internet ou falta de digitadores”.

Vânia Rebouças concorda. “Além de outros fatores, temos uma alimentação irregular do sistema de vacinação por parte das secretarias municipais. Apesar da Sesab fazer a atualização diária dos dados, há municípios que estão sem alimentar o sistema estadual há mais de uma semana. Isso nos preocupa e atrapalha a análise da situação da vacinação no estado”, destaca.

O secretário de saúde de Jucuruçu, Marcos Henrique Moreira, diz que a vacinação está acontecendo no município, mas reconhece o atraso no registro. “Em janeiro, checamos o sistema e vimos que não estava havendo registro. A mesma pessoa ficava responsável pela vacinação e por alimentar o sistema, então não dava conta. Isso foi revisto, foi contratada uma outra pessoa e agora o atraso está sendo corrigido”, afirma. A assessoria de Teixeira de Freitas também afirmou que há dificuldade em alimentar o sistema e que, por isso, está realizando um mutirão de digitação.

O secretário de saúde de Ilhéus, André Cesário, disse que o percentual de vacinação da segunda dose é de 82,54%, e não 47,46%, como aponta o levantamento. Segundo ele, a diferença se deve por conta do atraso de lançamento da vacinação no sistema, mas a situação está sendo regularizada.

Como as chuvas afetaram a vacinação? 

De acordo com Marcos Sampaio, a chuva que atingiu boa parte da Bahia entre o final do ano passado e o início deste ano fez com que muitas unidades de saúde fossem atingidas por enchentes, levando à perda de estoque de vacina, de material, de documentos e ainda comprometendo o sistema de digitação. Dos 28 municípios da lista com menos de 50% de cobertura para a segunda dose, 14 estavam na lista de cidades com estado de emergência decretado por conta das chuvas.

Para o Conselho Estadual dos Secretários Municipais de Saúde da Bahia (Cosems-Ba), a chuva é o principal fator para a desigualdade de cobertura vacinal. No final de janeiro, a presidente do conselho, Stela Souza, solicitou ao Ministério da Saúde auxílio financeiro em caráter emergencial para 105 municípios baianos que foram drasticamente atingidos pelas chuvas, totalizando 533 Unidades Básicas de Saúde (UBS) danificadas, com 10 tendo que ser totalmente reconstruídas. Também ainda não houve resposta.

“Nós ficamos com estradas interditadas, postos alagados, perdemos vacinas. Em dezembro, nós praticamente não vacinamos ninguém, não tinha condições. Além dos obstáculos, a prioridade era a vida das pessoas, as casas que foram perdidas, pessoas desabrigadas”, conta o secretário de saúde de Jucuruçu.

Por que é importante ter uma cobertura vacinal homogênea?

“Não adianta a Bahia ter uma meta satisfatória de vacinação se há áreas com uma cobertura regular ou ruim”, coloca o sanitarista e pesquisador do Instituto de Saúde Coletiva (ISC/Ufba), Ramon Saavedra. Mas ele destaca que também há uma parcela significativa da população que não está indo se vacinar, principalmente com a terceira dose. De acordo com dados da Sesab, 24,7% da população tomou a dose de reforço, o que representa 2.738.695 dos cerca de 15 milhões de baianos.

“Vale ressaltar que a dose de reforço é essencial. As pessoas estão com uma falsa sensação de proteção por ter a segunda dose, mas não é bem assim. Estudos comprovam que os anticorpos criados têm queda ao longo do tempo. Se a pessoa já tem mais de 6 meses que tomou a segunda dose, ela está em risco e precisa da dose de reforço. Por isso, é importante que as prefeituras e o Governo Estadual invista na busca ativa de faltosos, é uma estratégia necessária nesse momento”, alerta Saavedra.

Desmobilização de leitos covid

No ofício enviado ao Ministério da Saúde solicitando recursos extras para contratação de profissionais, há mais um pedido: o da garantia da continuidade do financiamento de leitos covid até que seja decretado o fim da pandemia. O pedido vem após a Portaria nº 4.226 do Ministério da Saúde prever a desmobilização de leitos de UTI covid a partir do dia 31 de janeiro de 2022. Os leitos autorizados até esta data foram mantidos e os demais tiveram o custeio cancelado.

Segundo Marcos Sampaio, presidente do CES-Ba, a decisão é precipitada e precisa ser revertida. “Nós consideramos que isso é precipitado. Essa retirada de recursos só pode ser feita no final da pandemia ou quando a ocupação de leitos esteja realmente baixa. Não é o caso, estamos batendo recorde de casos ativos, as prefeituras estão tendo que abrir mais leitos”, opina.

No ofício de solicitação de manutenção dos leitos, o CES-Ba considera a chegada da variante ômicron como fator de alerta e diz que o novo aumento de casos de covid está “superlotando as unidades de saúde”. “O momento continua sendo de preservar vidas com o aumento da transmissão provocada pela ômicron, necessitando conscientizar as pessoas para as ações sanitárias”, diz o documento. De acordo com o boletim da Sesab desta terça (8), a taxa de ocupação de leitos de UTI covid para adultos na Bahia é de 71%; já para crianças, de 64%.

O CORREIO tentou contato com os municípios de Encruzilhada e Varzedo, sem sucesso. O município de Mutuípe não respondeu até o fechamento da reportagem. O Ministério da Saúde também foi procurado, mas não retornou o contato.

Lista dos 28 municípios com menos de 50% de aplicação da 2ª dose:

  • Mutuípe – 20,83%
  • Varzedo – 32,68%
  • Encruzilhada – 34,21%
  • Amélia Rodrigues – 34,49%
  • Ichu – 24,76%
  • Iguaí – 34,95%
  • Caatiba – 35,30%
  • Teolândia – 35,44%
  • Jucuruçu – 37,19%
  • Esplanada – 38,52%
  • Nilo Peçanha – 38,71%
  • Muniz Ferreira – 39,10%
  • Pindobaçu – 39,16%
  • Gavião – 40,71%
  • Nova Redenção – 42,69%
  • Ipirá – 42,98%
  • Firmino Alves – 45,38%
  • Conceição do Coité – 47,08%
  • Ilhéus – 47,46%
  • São Francisco do Conde – 47,89%
  • Teixeira de Freitas – 48,06%
  • Elísio Medrado – 48,22%
  • Ubatã – 48,75%
  • Gandu – 49,28%
  • Novo Triunfo – 49,47%
  • Ituberá – 49,51%
  • Cordeiros – 49,64%
  • Antas – 49,79% (Correio da Bahia)