Ciro Gomes é uma figura explosiva. Isso não é novidade e até “virgens de urnas” que votaram pela primeira vez em 2018 já sabem disso. O histórico de destempero do ex-governador do Ceará é tão longo que dificilmente alguém conseguiria listar facilmente todas as vezes que o mais velho dos Ferreira Gomes perdeu as estribeiras em público e trocou farpas com qualquer um. O ex-presidenciável pelo PDT é praticamente um showman de barracos.

No entanto, uma coisa é inegável: Ciro tem peito para criticar abertamente a esquerda em um ambiente inteiramente dominado por ela, como aconteceu na Bienal de Artes da UNE nesta quinta-feira (7), em Salvador. O político cearense tem praticamente um selo “trago verdades”. Por isso as falas dele normalmente acabam por gerar tantas críticas. Na UNE, Ciro bradou a expressão que o irmão dele, senador Cid Gomes, cunhou antes do segundo turno das eleições de outubro: “Lula está preso, babaca”.

Fora o xingamento desnecessário, o pedetista expôs o que boa parte das chamadas “forças progressistas” insistem em não superar. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está encarcerado desde abril de 2018 e, após a segunda condenação, dessa vez pelo caso do Sítio de Atibaia, segue cada vez mais distante de deixar a prisão. Se não aceitam virar a página, a esquerda deveria ao menos seguir um pouco em frente. Não o faz.

Por enquanto, o discurso fica restrito ao “Lula Livre” e a denúncias esporádicas daquilo que consideram retrocesso no governo de Jair Bolsonaro. E, por mais que a esquerda acredite que é melhor do que os adversários, o resultado das urnas mostrou que o Brasil deu uma guinada à direita e a reconquista de espaços deveria ser a prioridade, caso a opção seja evitar uma hegemonia conservadora. Todavia, ao invés de discutir como fazer isso, há um egocentrismo na mitificação do ex-presidente.

Ok que essas pessoas acreditem que Lula é inocente. Mas pautar a agenda política única e exclusivamente com esse assunto é incorrer no mesmo erro do ano passado, quando se viu a ascensão de candidatos claramente contrários a temáticas progressistas. Como disse o ex-presidente do Uruguai Pepe Mujica: parte da esquerda não aprende as lições da história. O uruguaio falava da Venezuela, porém a avaliação cai como uma luva para o atual cenário político do Brasil.

Voltando a Ciro “Trago Verdades” Gomes. A estratégia dele sempre foi pautada em responder a provocações. Na Bienal da UNE, enquanto os apoiadores dele investiam no coro “Cirão da Massa”, os correligionários de Lula traziam um “Lula Livre”, numa espécie de contraponto. Exatamente aí que parece haver uma dissonância desnecessária entre os dois grupos. Pelo menos, em teoria, ambos deveriam caminhar numa única direção. O difícil é conseguir colocar em prática todo o discurso de que, na democracia, o diálogo é a melhor estratégia para seguir em frente.

Sob o risco desses atores se tornarem meros espectadores do bonde chamado história – que será contado sob a perspectiva dos vencedores, como se sabe. Ao avaliar o resultado das eleições de outubro como “humilhante” para o campo progressista, o político cearense acerta em cheio. Ultimamente, Ciro evidencia muito mais defeitos do que qualidades. ][

Mas a esquerda deveria ao menos ouvir o que ele tem a dizer. Geralmente é uma verdade difícil de engolir. Mas nem por isso deixa de ser verdade. Este texto integra o comentário desta sexta-feira (8) para a RBN Digital, veiculado às 7h e às 12h30, e para as rádios Excelsior, Irecê Líder FM, Clube FM e RB FM. Por Fernando Duarte