Alguns dias após o resultado das eleições, entidades da área de saúde divulgaram um manifesto recomendando a permanência das políticas públicas de prevenção e tratamento de HIV/Aids. O posicionamento está relacionado a um temor sobre o futuro dos programas no governo do presidente eleito Jair Bolsonaro. Em 2010, Bolsonaro afirmou que o Estado não deveria custear o tratamento para HIV/Aids.

 

“Uma pessoa que vive na vida mundana depois vai querer cobrar do poder público um tratamento que é caro”, criticou o deputado federal Jair Bolsonaro. “Se não se cuidou, o problema é deles”, pontuou ele. De acordo com levantamento realizado no ano de 2017 pelo Ministério da Saúde, o Brasil tem cerca de 548 mil pessoas em tratamento contra HIV no país.

 

Apenas na Bahia, 19,5 mil pacientes utilizam a terapia antirretroviral, mostram dados da Sesab. Os números de infectados poderiam ser ainda maiores, caso o serviço não fosse oferecido via SUS. “O Brasil está na vanguarda com relação a vários outros países que ainda não têm esse tipo de estratégia no serviço público”, avaliou a coordenadora do programa de DST/Aids da Secretaria Municipal de Saúde de Salvador, Helena Lima.

 

“Não é importante só porque melhora a saúde do indivíduo. Com uma carga viral suprimida, ele deixa de transmitir para outras pessoas, colaborando com a quebra dessa cadeia. Não é só um benefício para o indivíduo que está se tratando, mas para a sociedade como um todo”. O coquetel antirretroviral tem a capacidade de reduzir a quantidade de HIV no sangue para níveis que são indetectáveis por testes laboratoriais padrão.

 

De acordo com o programa das Nações Unidas para HIV/Aids, Unaids, há um consenso crescente entre cientistas de que pessoas com carga viral indetectável em seu sangue não transmitem o vírus sexualmente. O orçamento do Ministério da Saúde para combate ao HIV, Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) e Hepatites Virais para 2018 é de R$ 1,7 bilhão.

 

Deste total, o recurso para medicamentos é de R$ 1,2 bilhão. De acordo com a pasta, estima-se que o custo médio ponderado anual para tratamento com antirretroviral no Brasil, por pessoa vivendo com HIV, foi de R$ 2.137,17 no ano passado. Com base nesses dados, o paciente com HIV teria que investir aproximadamente R$ 180 por mês para tratamento.

 

“Seria um grande retrocesso se isso acontecesse, porque você imagina a despesa que isso representa no orçamento de um indivíduo que vai fazer uso crônico de uma medicação. Esse impacto financeiro já seria um fator dificultador para que esse indivíduo faça o tratamento”, argumentou Helena.

 

Apesar de já representar um gasto relativamente alto, o valor considera apenas os antirretrovirais, mas alguns pacientes precisam utilizar medicamentos auxiliares para tratar sintomas ou efeitos colaterais. Atualmente, essas medicações auxiliares são oferecidas a nível estadual ou municipal, enquanto os antirretrovirais são fornecidos pelo governo federal.

 

“Muitas vezes, é preciso usar medicações preventivas, para não manifestar sintomas, ou até que o sistema imune se restaure com o coquetel, que exige um tempo para ter a eficiência. Há também o tratamento auxiliar para o caso de efeitos colaterais. Isso melhorou muito com os novos coquetéis, mas ainda pode acontecer”, explicou a infectologista Miralba Freire, diretora do Centro Estadual Especializado em Diagnostico Assistência e Pesquisa (Cedap).

 

A política brasileira de combate a HIV/Aids é apontada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como um exemplo a ser seguidos pelos países emergentes. Em Salvador, a testagem para o vírus está disponível na maioria das unidades municipais de saúde.

 

No caso de resultado positivo, o tratamento especializado é oferecido no Serviço Municipal de Assistência Especializada (Semae), na Liberdade; no Serviço de Atenção Especializada (SAE) São Francisco, em Nazaré; e no SAE Marymar Novaes, no Bonfim. Há também unidades do Estado que oferecem tratamento: Cedap, hospitais das Clínicas, Roberto Santos e Couto Maia.