O médico e cientista Miguel Nicolelis, que é membro do Comitê Científico do Consórcio Nordeste, recomendou uma análise cautelosa aos gestores das cidades que querem reabrir o comércio, em meio à pandemia do coronavírus. O comitê foi formado para auxiliar os governadores da região a tomar decisões no enfrentamento à Covid-19. Na Bahia, o monitoramento é feito em várias cidades, entre elas, Salvador, Feira de Santana, Vitória da Conquista, Ilhéus e Itabuna.

“Nós ainda temos uma posição de cautela, porque os dados ainda estão subindo. Tem boas notícias, mas tem também a preocupação, por causa do crescimento dos casos. Tanto dos casos confirmados quanto dos óbitos nas cidades, que sugerem que a gente tenha um pouco mais de cautela nessa possibilidade de reabrir comércio, principalmente nas cidades do interior, cidades que estamos monitorando e estamos vendo ainda crescimento de casos”, alerta Nicolelis. A principal preocupação do cientista é que a reabertura do comércio leve mais pessoas para as ruas, diminuindo o isolamento social, que é a principal forma de contenção do contágio.

“A taxa de isolamento social está caindo. Em alguns lugares, nós achamos que o ‘lockdown’ [fechamento total] tem que ser feito imediatamente. Estou muito preocupado com Feira de Santana, porque, se fizesse o isolamento, mantivesse os níveis da semana em que o comércio fechou, uns 10 dias mais ou menos, o isolamento aumentava um pouco e os números do final de junho seriam aceitáveis, seria um número por volta de 1.300 casos. Agora, se abrir de vez, se o isolamento cair total, abrir tudo, esse número triplica. Isso me preocupa demais, e ao comitê todo”, pondera o cientista.

Nicolelis aponta ainda que a queda nos números de ocupação das UTIs refletem diretamente nas cidades onde o fechamento do comércio foi feito de forma mais rigorosa. “Em Salvador, por exemplo, houve um aumento de leitos disponíveis, então mostra que caiu a ocupação das UTIs, o que é uma notícia positiva. Nós estamos vendo que existe, na capital, um movimento setorizado, com uma abertura planejada cuidadosamente”, avalia o especialista. Os efeitos inversos também são percebidos em outras localidades da Bahia, onde houve relaxamento na abertura do comércio.

“Feira de Santana e Ilhéus continuam sendo preocupações que nós temos que monitorar, sem dúvida nenhuma. Juazeiro, com a sua conexão com Petrolina, também é uma preocupação. Eu tenho algumas projeções. Juazeiro teve um aumento de 23 casos em 14 dias, um aumento de 191%. Então isso entra na nossa categoria de monitoração mais próxima, porque um aumento nessa magnitude é significativo. Vitória da Conquista tem 108%, Feira de Santana continua o aumento de 185% em 14 dias, medidos até a sexta-feira (29)”, destacou. O cientista pondera que, para que as medidas de restrição funcionem, é preciso que a população entenda a necessidade do isolamento social.

“Não basta só o gestores estarem preocupados em salvar vidas, como todos estão. Tentar criar essas medidas, estabelecerem por decreto as medidas, se a sociedade não colaborar. Se a sociedade não entender a gravidade do momento que nós estamos passando no Brasil, e obedecer as determinações. Os gestores têm que ter a colaboração da sociedade. Porque chega em um momento que se tem poucas condições de ação. E, se os números continuam crescendo exponencialmente, o sistema de saúde começa a ficar próximo de uma sobrecarga total. Aí não se tem opção e tem que criar o lockdown. Temos que ter essa comunhão de objetivos entre a sociedade e os gestores”, disse. G1