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O Ministério da Saúde rejeitou uma recomendação técnica para banir o kit Covid do SUS, e provocou reações da comunidade médica. O governo insiste no chamado kit Covid desde o início da pandemia, mesmo depois de cientistas do mundo inteiro e a Organização Mundial da Saúde terem atestado que medicamentos como a cloroquina não têm nenhuma eficácia contra Covid e que ainda podem oferecer riscos para a saúde dos pacientes.

Depois de muitas críticas da comunidade científica, em abril, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, pediu que a Conitec analisasse as diretrizes do tratamento da Covid – a Conitec é um órgão colegiado que tem como objetivo assessorar o ministério em questões como incorporação ou exclusão de protocolos médicos adotados no SUS.

Em maio, o ministro Queiroga foi questionado na CPI da Covid sobre o uso desses medicamentos sem eficácia na rede pública. Ele se esquivou várias vezes, alegando que aguardava decisão da Conitec. Em dezembro, a Conitec aprovou o relatório contra o kit Covid, mas nesta quinta-feira (20), mais de um mês depois, o ministério rejeitou as recomendações da Conitec.

O secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde, Hélio Angotti, assinou a decisão, sob a alegação de garantir a autonomia para os médicos. Ele também disse que a decisão da Conitec não foi consensual. A recomendação da comissão não é obrigatória, mas é comum que seja acatada pelo ministério.

“E do que eu recordo, sim, é uma primeira decisão publicada que destoa, mas destoa de uma decisão que foi muito, podemos dizer assim, muito discutida a nível de Conitec e não alcançou também um consenso. Então, nós vivemos um momento muito desafiador, e isso também chama a atenção, é claro”, declarou Angotti. O presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde, Carlos Lula, considerou a decisão uma afronta à ciência.

“Qual deveria ser a posição do Ministério da Saúde? Tomar as decisões de acordo com as evidências da ciência, e não das conveniências da política. Mais uma vez, o ministério se coloca de forma afrontosa à posição de um órgão técnico, que tomou uma decisão de maneira técnica e de acordo com as melhores evidências científicas”, critica. A decisão do ministério está alinhada ao discurso do presidente Jair Bolsonaro, e contra o que diz a comunidade científica.

“Não foi só uma opinião dos médicos. Não foi só todo esse trabalho das sociedades médicas, dos cientistas brasileiros. Nenhuma entidade de pesquisa ou nenhuma sociedade médica internacional – quer seja a FDA, o CDC dos Estados Unidos, nenhuma sociedade médica europeia -, ou qualquer organismo internacional relacionado a saúde, apoia, recomenda hidroxicloroquina, ivermectina, cuxicina no tratamento da Covid-19. Portanto, nos parece uma insistência muito mais política e ideológica de quem está à frente do Ministério da Saúde do que realmente uma preocupação com as melhores evidências clínicas no tratamento da Covid para a população brasileira”, destaca Alexandre Naime Barbosa, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia.

Especialistas e sociedades médicas já preparam um recurso contra a decisão ao Ministério da Saúde. O prazo para a contestação é de 10 dias. O médico Carlos Carvalho, que coordenou o estudo da Conitec, que rejeitou o uso do kit Covid, disse que vai pedir para o ministro Marcelo Queiroga rever a decisão. Em entrevista à Globonews, ele disse que o conselho foi pego de surpresa.

“Foi complemente inesperado por todos nós, e causou uma certa – digamos assim -, indignação, porque não fomos comunicados e nem fomos chamados pra discutir mais. Simplesmente, ele fez a publicação da nota técnica. Esse pedido de revisão que nós, os pesquisadores, estamos respondendo – baseado ponto a ponto nos comentários que esse secretário fez na nota técnica -, nós vamos encaminhar esse pedido de revisão diretamente para o ministro, porque não teria sentido encaminhar para quem já disse que não vai publicar”, afirma. G1