Alex Pazuello/Manaus

Um estudo calculou as consequências financeiras das mortes por Covid de trabalhadores e aposentados. Dor não se mede em números, mas a morte inesperada de um parente tem um efeito colateral imediato: famílias desestruturadas emocionalmente também precisam se recompor financeiramente. A mulher de Kaiki era cabeleireira. Estava em casa por causa da gravidez. Enquanto isso, ele segurava as pontas fazendo bico como caminhoneiro. Largou tudo quando a Covid levou Lucivânia, 18 dias depois do nascimento da filha, a caçula de três irmãos.

“Meus filhos são prioridade. Eu tenho que cuidar, mas eu também tenho que trabalhar para trazer coisas para dentro de casa. Até o momento, eu tenho recebido bastante ajuda com doações, nessa parte de conta. Às vezes dá o dinheiro para pagar, às vezes pede e paga as contas”, contou o metalúrgico desempregado Kaiki Raimezonni. Luis e Nádia ficaram juntos por 23 anos e, juntos, pegaram Covid em março deste ano. Ele se curou, ela morreu no hospital. Agora, o professor pensa em trabalhar menos para cuidar das filhas gêmeas, de dez anos.

“No ano que vem, eu tenho que tomar algumas decisões sobre pegar só aula à tarde, não à noite. Então, vai ter que mexer com muita coisa na nossa estrutura familiar aqui. Mexe com toda a estrutura, inclusive financeira”, disse o professor de História Luis Eduardo dos Santos Franco. São as dificuldades enfrentadas nesse momento por duas famílias, mas a situação se multiplica em centenas de milhares de lares das vítimas da Covid no Brasil. Um estudo da Fundação Getúlio Vargas tenta dimensionar os impactos das mortes de pessoas da população economicamente ativa para o país.

Os pesquisadores usaram dados das certidões de óbitos por Covid registradas em cartórios. Com base na idade de cada pessoa, calcularam a média de salário mensal, segundo a Pnad – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE – e qual seria o rendimento anual. Na faixa de 20 a 69 anos, a perda de renda é da ordem de R$ 8,4 bilhões por ano. Acima dos 70 anos, a estimativa é de R$ 6 bilhões. Nessa faixa, havia muitos aposentados que garantiam o sustento da família.

“São pessoas que vão fazer falta ao país, são pessoas que já estavam treinadas, já tinham uma série de habilidades adquiridas ao longo da vida, sua própria formação escolar. Então, isso reduz a produtividade do país. E elas poderiam continuar contribuindo com o país e para as suas famílias”, explica Claudio Considera, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia/FGV.

Os cálculos são conservadores, porque nem consideram o impacto no orçamento familiar de casos como de Kaiki, que ainda não voltou a trabalhar por causa dos filhos pequenos. “A única coisa que eu estou tentando, correndo atrás, é de acertar meus filhos, sabe? Porque não adianta eu ir trabalhar, não acertar isso corretamente e depois ter que, pouco tempo depois, ter que sair ou ter que ficar faltando, porque determinada pessoa talvez tenha compromisso, não tenha com quem deixar meu filho, e ficar essa bagunça. Essa é a maior dificuldade na parte de eu voltar a trabalhar que eu estou tendo hoje”, pontuou Kaiki. G1