Agência Brasil

Cerca de 35% das famílias baianas cadastradas no CadÚnico são monoparentais femininas, ou seja, lideradas por mulheres sem cônjuge. A porcentagem representa 960.763 famílias. Os dados são do estudo realizado pela Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI) em parceria com a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM). A pesquisa foi feita em 2020 e resultou na publicação “Perfil da monoparentalidade feminina na Bahia: atualizações e novas temáticas”, lançada nesta terça-feira (25). (Clique aqui para conferir a publicação na íntegra)

O conceito de família monoparental refere-se a uma mãe ou a um pai que vive sem cônjuge e com filhos dependentes. Esse tipo de família, apesar de antigo, foi reconhecido pelo Direito brasileiro somente com a promulgação da Constituição de 1988. A publicação da SEI tem por objetivo conhecer o perfil dessas famílias lideradas por mulheres e, assim, planejar políticas públicas que possam atendê-las. Os dados foram coletados a partir do sistema CadÚnico, que identifica famílias de baixa renda.

A pesquisa revelou que a maioria das mulheres que chefiam famílias monoparentais são negras, com baixa escolaridade e em situação de extrema pobreza. “O estudo revela a questão fundamental: a relação que existe entre a dominação patriarcal, o racismo estrutural e a desigualdade social”, disse Julieta Palmeira, titular da SPM, durante o lançamento virtual transmitido através do YouTube da SEI.

No estudo, a maioria das mulheres se autodeclararam negras (89,4%), com idade entre 25 a 49 anos (75,1%), que cursaram até o ensino fundamental completo (55,3%) e, as que declararam ter alguma ocupação fora dos lares, trabalham por conta própria (69,6%). Predominam as famílias em situação de extrema pobreza, com renda per capita familiar mensal de até R$ 89,00 (74,5%).

O estudo do tema teve início em 2017. No ano seguinte, foi publicado o livro “Chefas de Família: perfil da monoparentalidade feminina na Bahia”, a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do Censo Demográfico e da Pesquisa de Emprego e Desemprego da Região Metropolitana de Salvador. Agora, em 2022, é lançada a segunda parte da pesquisa, a partir de dados do CadÚnico de maio de 2021, quando havia 2.756.545 famílias baianas cadastradas.

“Ainda tínhamos mais para descobrir, principalmente depois da pandemia, que agravou a situação dessas mulheres. Não basta saber quantas famílias estão nessa situação, mas o perfil específico delas. Só assim é possível fazer políticas públicas acertadas”, declarou Julieta Palmeira.

A titular da SEI ainda fez menção à fala do vice-presidente Hamilton Mourão, em 2018, sobre famílias monoparentais femininas. Na época, ele afirmou que “Casa só com ‘mãe e avó’ é ‘fábrica de desajustados’ para tráfico”.

“Lares em que as mulheres criam seus filhos sozinhas não são fábricas de desajustados. Essa fala não é verdade. Essas mulheres são responsáveis, criam seus filhos com esforço e trabalho e merecem respeito”, disse Julieta.

A diretora-geral da SEI, Jorgete Costa, acrescentou que, para o sucesso das políticas públicas, é preciso que as secretarias trabalhem em conjunto a partir das informações reveladas pela publicação. “A mulher que lidera uma família monoparental tem um endereço e uma cor e são as mais vulneráveis. Quando a gente identifica o perfil desse grupo, percebe que o caminho para a política fica mais acertado.

O que a monoparentalidade feminina revela?

Para a pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (Neim), Márcia Macêdo, a monoparentalidade é heterogênea. “A chefia feminina nem sempre está relacionada à situação de pobreza. O crescimento do número de famílias chefiadas por mulheres também reflete a emancipação feminina dentro dos relacionamentos e a expansão das mulheres no mercado de trabalho”, coloca.

Mas a monoparentalidade também está associada à maior responsabilidade atribuída às mulheres com o cuidado dos filhos. “Há uma crueldade nesse mundo da mãe solo, que ficou mais evidente durante a pandemia. Essa emancipação vem junto com um outro lado que é o afastamento ou abandono por parte dos pais das crianças. Há estudos que mostram que os homens, após a separação, chegam a ficar mais próximos dos enteados, filhos das novas mulheres com quem se relacionam, do que com os próprios filhos do antigo relacionamento”, acrescenta Márcia. Correio da Bahia