Foto: Rafael Carvalho

Primeiro ministro a ser demitido do governo Jair Bolsonaro (PSL), o advogado Gustavo Bebianno (PSL) ressalta que nunca viu um governo que acumulasse tantos desgastes em menos de seis meses de exercício. Ele perdeu o posto em meio à suposição de que o PSL pode ter financiado candidaturas-laranjas durante a eleição – no período, Bebianno era presidente nacional da sigla -, mas o ápice foi a divulgação de conversas entre ele e o presidente feitas pelo vereador Carlos Bolsonaro (PSL), segundo filho do capitão. Após sua saída da Secretaria-Geral da Presidência, em fevereiro, outros três ministros caíram e Bolsonaro protagonizou uma série de embates públicos com o Poder Legislativo.

“Posso mencionar uma relação que se deteriorou por conta de nada. Na primeira vez em que eu estive com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, aqui na casa do Paulo Marinho, entre o primeiro e segundo turnos, traçamos algumas perspectivas em relação ao Brasil. Fizemos ali um pacto, com a anuência do presidente, para que houvesse uma relação amistosa, institucional positiva. As pautas, que naquela época já se mostravam que seriam abraçadas pelo Paulo Guedes para a economia, revelaram um Rodrigo Maia muito receptivo. Até porque as pautas eram muito mais da Câmara do que do presidente. Logo após a eleição, vimos a aliança, que foi feita com tanto carinho com Rodrigo Maia, começar a ser destruída por questões ideológicas”, criticou Bebianno em entrevista à revista IstoÉ.

Em março, Bolsonaro e seus filhos começaram a fazer ataques aos deputados federais e, em especial, a Maia. Eles diziam que os parlamentares não avançavam no trâmite das propostas do governo por serem representantes da “velha política”, que opera de acordo com eventuais recompensas. Como resposta, o presidente da Câmara cobrava comprometimento do capitão para engajar sua base política no Congresso e chegou a dizer que ele não presidia o país da forma adequada. Agora fora do governo, Bebianno defende a postura de Maia.

“Eu sou testemunha de que o presidente Rodrigo Maia nunca exigiu, nunca sugeriu, nunca acenou o toma lá dá cá de espécie alguma. Muito pelo contrário. A postura dele sempre foi de total apoio ao presidente. Ora, se você estabelece uma parceria com alguém que vai ser o presidente de um outro poder, e com o qual você tem que se relacionar de forma harmônica, como é que logo no início do governo você permite xingamentos, agressões, deboches ao presidente da Câmara? E tudo partindo do núcleo duro do Palácio do Planalto. Com o filho do presidente agredindo o presidente da Câmara. Isso nunca foi visto na história do país. Nem os filhos do Lula e da Dilma atrapalharam tanto um governo”, ressalta o ex-ministro, acrescentando que a prole do presidente “se mistura” ao filósofo Olavo de Carvalho, apontado como guru de Bolsonaro.

No caso dos militares, por exemplo, o advogado acredita que as ações do presidente, a exemplo da demissão do general Santos Cruz da Secretaria de Governo, tem o afastado da categoria. “À medida que o presidente rifa seus próprios aliados, com um tiro na nuca, execução sumária, o sinal que ele está dando para esse núcleo militar é péssimo”, frisou. Além disso, Bebianno acredita que o presidente tem se afastado da militar, que é também alvo de ataques. A última demissão, por exemplo, foi a do general Santos Cruz, que ocupava o posto de ministro da Secretaria de Governo. Ao falar com a imprensa, o general disse que a gestão Bolsonaro “é um show de besteiras”.

Com tudo isso, Bebianno julga que o próprio Bolsonaro se isolou. “Ele está governando de acordo com os poderes estabelecidos pela Constituição. Não foi eleito para ser o soberano, o imperador do Brasil. Foi eleito para ser o presidente do Brasil, dentro das regras democráticas que estão em vigor. Me causou estranheza logo no início do governo o presidente dizer que era muito difícil governar com esse Congresso aí. E eu fiz a pergunta: o que significa esse Congresso aí? Ora, esse Congresso é legitimo. Sofreu uma renovação de 50%. Não compreendi muito bem essa frase. Achei temerária”.

Diante desse quadro, ele não acha correto o presidente já sinalizar que pretende tentar a reeleição quando nem sequer completou seu primeiro ano de governo. Bolsonaro deu esse indício há duas semanas, na Marcha para Jesus, em São Paulo. “Eu nunca vi isso. Começar a falar em reeleição com seis meses de governo é um erro terrível”, classificou.

Essas declarações são fruto da primeira grande entrevista concedida por Bebianno após sua demissão, À época, se especulou que ele seria uma espécie de “homem-bomba” dada a quantidade de informações que ele poderia ter. Presidente nacional do PSL durante a eleição, o advogado era visto como um braço-direito de Bolsonaro, tendo abandonado sua carreira no setor privado para seguir os passos do presidente. Por isso, ele diz que essa especulação “foi coisa de mau caráter”.

“Não sou um rato, jamais faria isso. Mas, por outro lado, eu tenho senso crítico. Eu tenho uma crítica muito severa em relação ao governo. Não dediquei dois anos da minha vida para ver um governo conduzido agora de forma somente ideológica. A ideologia se sobrepondo a decisões técnicas que precisam ser tomadas”, criticou. Ainda na vice-presidência nacional do partido, ele pretende fechar esse ciclo nesta semana. À revista, Bebbiano disse que o PSDB ou o DEM são caminhos possíveis e não descarta uma candidatura à prefeitura do Rio de Janeiro.