Em três décadas de história, a relação entre Vitória e Barradão se confunde. Foi a partir da construção do estádio, finalizada na década de 80, que o Rubro-Negro se tornou uma potência, assumiu a hegemonia do futebol baiano e construiu um elo com os seus torcedores. Com a decisão de se mudar para a Arena Fonte Nova pelos próximos três anos, anunciada nesta semana pelo presidente Paulo Carneiro, o clube entra em uma nova era, e é difícil prever o que acontecerá com o estádio que os rubro-negros costumam chamar de santuário. Em entrevista, o mandatário avisou que o local receberá jogos das equipes de base, do sub-23 e talvez do futebol feminino.

Quis o destino que o homem que costurou a saída do Barradão fosse o mesmo que fez o clube florescer sobre um estádio construído basicamente no meio do nada, no bairro que viria a se tornar Canabrava, perto do local onde ficava o aterro sanitário da cidade de Salvador. Embora tenha sido inaugurado em 1986, em um empate em 1 a 1 com o Santos, o Manoel Barradas, batizado assim em homenagem a um icônico ex-presidente, só passou a ser utilizado com mais frequência em 1991, ano em que Paulo Carneiro assumiu a presidência do clube pela primeira vez.

Carneiro assumiu um Vitória que havia sido rebaixado para a Série B e buscava um “fato novo” para atrair a torcida. Encontrou esse elemento no Barradão, que havia sido deixado de lado desde a sua inauguração, cinco anos antes. Quase 30 anos depois, o dirigente está de volta à presidência rubro-negra e enxerga na mudança do Barradão para a Fonte Nova a possibilidade de recriar um “fato novo” a fim de reconstruir o Vitória, que enfrenta uma crise financeira. Paulo Carneiro defendeu que o torcedor do Vitória desejava essa mudança.

– O torcedor queria a mudança. É muito claro isso. Nada contra o nosso estádio, a nossa paixão. Eu falo isso com um pouco de sentimento porque foi com a minha chegada, há anos atrás, que esse estádio ganhou vida. Mas a vida é assim, você tem que encarar os problemas presentes. Nesse momento nós entendíamos que, em função da pouca presença do torcedor aqui no estádio nos últimos dois anos, o Vitória acha que com essa parceria o torcedor volta ao estádio. E o sócio se apresenta ao clube, o torcedor se apresenta do clube para se transformar em sócio. Acho que esse é o grande objetivo da parceria – afirmou o presidente.

É impossível não correlacionar a irônica semelhança entre passado e presente que estão colocadas à mesa. Clube na Série B, Carneiro na presidência, mudança de casa e necessidade de se reconectar com o torcedor, razão da existência de qualquer clube. Entretanto, as diferenças também estão expostas, e a qualquer observador cabe não ignorá-las.

Há 30 anos, o Vitória não era nem sombra do que é hoje. Basta tomar como exemplo a quantidade de títulos baianos: sem o Barradão, em mais de 80 anos de existência, eram apenas dez; pós-Barradão, foram 19 (incluindo as edições de 89 e 90), quase o dobro. Isso sem falar em marcas expressivas, como os vice-campeonatos da Copa do Brasil e das Séries A e B do Campeonato Brasileiro.

No Barradão, o Vitória impôs uma série de derrotas ao rival Bahia e chegou a ficar oito anos sem perder um clássico no estádio. Isso tudo era, de certa maneira, personificado na figura de Paulo Carneiro, que não perdia uma oportunidade de alfinetar o Tricolor. Ele durou 15 anos na presidência, até o ano de 2005, quando renunciou depois que o clube caiu para a Terceira Divisão.

O momento hoje é outro. O Vitória se encontra estabelecido entre os grandes clubes do Brasil, porém tenta superar uma crise terrível que o atirou na Série B, onde o objetivo é brigar pelo G-4, mas a realidade, até o momento, é de luta para fugir da zona do rebaixamento.

A estratégia de Paulo Carneiro é arriscada, pois relega a segundo plano o estádio que é o chamego do torcedor. Ele tenta provar, entretanto, que está uma vez mais enxergando além do óbvio, ao tentar aumentar as receitas do clube, e para isso cita até o exemplo do maior rival.

Contribuiu com nosso rival. É só olhar os números do nosso rival há cinco anos, quando ele ainda jogava em Pituaçu. É só olhar os números. Agora, nós temos que ser competentes. E aí vamos ter Ba-Vis muito agradáveis de se ver. E sempre, como foi na minha época, com a vitória do Vitória. O primeiro jogo do Vitória na casa nova tem data marcada: neste sábado, a equipe enfrenta o Guarani, às 16h30, na Arena Fonte Nova. Globoesporte