Foto: Maria Júlia Araújo/g1

As campanhas presidenciais dos dois líderes das pesquisas de intenção de voto, Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL), colocam em seu radar o voto religioso, em especial o do público evangélico. O g1 traz o que a lei diz que pode e não pode ser feito dentro de espaços religiosos durante a eleição de 2022.

Segundo a lei eleitoral, igrejas, templos, terreiros e demais espaços religiosos são classificados como “bens de uso comum”. Entram nessa lista locais em que a população em geral tem acesso, como cinemas, lojas, estádios e mercados – além dos espaços para propagação da fé.

É proibido veicular propaganda de qualquer natureza, seja exposição de placas, faixas, cavaletes, pinturas ou pichações – a propaganda positiva. O mesmo vale para ataques a outros candidatos – a chamada campanha negativa. Fazer algum tipo de propaganda pode gerar multa de R$ 2 mil a R$ 8 mil.

Mesmo com a proibição, a lei – e sua aplicação na prática – deixa aberta como será vista a ação específica de um líder religioso junto aos fiéis.

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  • O que um líder religioso pode fazer
  • Visões diferentes de especialistas
  • Como a Justiça eleitoral julgou campanhas dentro de ambiente religioso em eleições anteriores
  • Casos punidos
  • Casos não punidos

É difícil traçar uma linha até onde se pode fazer propaganda e a partir de onde não pode. A fala é de Henrique Neves, ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e atualmente advogado eleitoral.

“As manifestações pessoais, seja do clérigo ou de quem conduz a cerimônia, falar ‘eu gostaria de votar, eu vou votar’, isso é tolerável. Não importa a religião. O que não pode fazer é transformar uma cerimônia religiosa em um ato de propaganda eleitoral, uma missa em comício”, afirma.

O ex-ministro afirma que igrejas são consideradas pessoas jurídicas – como se fosse uma empresa, na prática. Pela lei, nenhum candidato pode ser financiado por empresas. Assim, um possível ganho dentro de igrejas, templos ou terreiros seria considerado como abuso de poder econômico cometido pela campanha.

O advogado Alberto Rollo, especialista em direito eleitoral há 30 anos, diz que sugere a seus clientes que façam distribuição de materiais em frente aos espaços religiosos, na calçada, não dentro deles. O que não configuraria infração da lei eleitoral, na sua avaliação.

“Não pode distribuir material internamente e o religioso não pode pedir voto. Pode dizer que gosta de Lula porque ele é barbudinho, que gosta de Bolsonaro porque ele é não sei o que. Isso pode, a pessoa tem liberdade de manifestação. Agora, pedir voto, não”, diz.

Rollo afirma que as penas costumam ser em multa, mas pode virar crime com pena mais dura a depender do que for dito. “Se for ofensa grave, chamar o candidato de ladrão, é um crime mais grave. Não dá para dizer que o Lula é ladrão, juridicamente é errado porque as condenações foram anuladas. Se dizer ‘Lula é ladrão’, isso é uma ofensa grave e crime, entra na linha de calúnia e difamação”, diz.

Decisões na Justiça eleitoral

Em consulta a decisões anteriores feita no site da Justiça eleitoral, não há exemplo de cassações de candidaturas por conta de crimes eleitorais cometidos em igrejas. A ação configuraria abuso de poder econômico, como os casos são tratados no TSE.

Porém, há decisões disponíveis, como um caso ocorrido em 2016 na cidade de Diadema (SP). Um candidato à Prefeitura teve seu nome e número de campanha divulgados por um pastor em três cultos, ocorridos em diferentes dias e horários. Declarou aos presentes que o político contaria com apoio da instituição religiosa.

Houve punição da 1ª instância dentro de abuso de poder econômico, o que a instância superior reviu. O Tribunal de Superior Eleitoral considerou, de forma unânime, que não ficou configurada gravidade nas condutas do candidato e de sua vice capaz de o caso ser encarado como abuso de poder.

O mesmo ocorreu em 2018, quando num culto em Macapá (AP) o pastor disse, ao lado de dois candidatos, que: “A nós, como cristãos, nós temos que votar com ideologia. Amém! Alguém que vai defender os nossos conceitos cristãos (…) e aqui está homens e mulheres de Deus pra isso, amém?!”.

Para o TSE, não ficou configurado “desequilíbrio na disputa eleitoral ou evidente prejuízo potencial à lisura do pleito” e não considerou o caso como abuso de poder econômico.

No entanto, o mesmo TSE costuma manter punições econômicas para casos de propaganda dentro de igrejas, templos e terreiros. Em 2018, uma candidata teve seu nome citado em culto como indicada para concorrer como deputada estadual.

A 1ª instância entendeu que houve campanha antecipada dentro do templo religioso e aplicou multa de R$ 2 mil. Em avaliação superior, o TSE manteve a punição, sem considerá-la abuso de poder econômico. G1