A incerteza com o futuro da economia tem um impacto bilionário para o Brasil. Apenas no ano passado, a falta de clareza sobre o rumo do país custou quase R$ 40 bilhões. Os números foram calculados pela consultoria Tendências e tiveram como base o Indicador de Incerteza da Economia apurado mensalmente pelo Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).
A conclusão do estudo da Tendências é que, se a incerteza no país tivesse permanecido num patamar neutro, o Produto Interno Bruto (PIB) do ano passado teria avançado 1,7%, acima do índice de 1,1% apurado oficialmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Dessa forma, se tivesse ocorrido um avanço mais acelerado do PIB num cenário de baixa incerteza, a economia teria alcançado um tamanho de R$ 6,832 trilhões, e não de R$ 6,794 trilhões em 2018. A diferença de quase R$ 40 bilhões é maior, por exemplo, do que o orçamento do programa Bolsa Família, estimado inicialmente em R$ 30 bilhões neste ano.
“O ano passado foi marcado por uma eleição presidencial, o que já traz alguma incerteza”, afirma o economista da Tendências e responsável pelo estudo, Lucas Silva. “Houve ainda a greve dos caminhoneiros (em maio de 2018), que mostrou que um setor pode parar toda a economia.”
Em 2018, a média do Indicador de Incerteza da Economia foi de 114 pontos. Um índice neutro – ou seja, aquele que não prejudica a atividade econômica – é de 101,9 pontos, segundo a Tendências.
A magnitude da incerteza numa economia é bastante importante. Quando ele sobe e, portanto, há pouca clareza quanto ao futuro do país, investimentos são postergados pelos empresários e consumidores adiam a compra de bens, dificultando o crescimento econômico.
O levantamento mostrou, por exemplo, que num quadro de incerteza neutra, os investimentos teriam crescido 11% no ano passado. A alta apurada pelo IBGE, no entanto, foi de 4,1%. “O baixo crescimento do país está muito atrelado ao desempenho do investimento”, afirma Lucas. “E o investimento é bastante sensível ao quadro de incerteza.”
Incerteza segue em alta
Em junho, no último dado divulgado, o Indicador de Incerteza da Economia, medido pelo Ibre/FGV, ficou em 119,1 pontos. Houve apenas uma queda de 0,4 ponto na comparação com maio, e o indicador segue num patamar elevado. A economia brasileira lida com um quadro de incerteza elevada há quatro anos.
De lá para cá, o país começou a enfrentar uma severa crise fiscal, que culminou com a perda do grau de investimento pelas agências de classificação de risco, passou pelo processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, encarou a inédita greve dos caminhoneiros, e absorveu os impactos da eleição presidencial do ano passado, marcada pela polarização.
“A incerteza está num patamar elevado desde 2015”, afirma o superintendente de estatísticas públicas do Ibre/FGV, Aloisio Campelo. “Nesses anos, a exceção se deu em apenas seis meses, entre os quatro últimos meses de 2017 e os primeiros dois meses de 2018”, diz.
Atualmente, o alto grau de incerteza é explicado pela necessidade de o governo conseguir tirar do papel uma robusta agenda de reformas que seja capaz de acelerar o crescimento do país. A principal delas é a da Previdência, considerada fundamental para o acerto das contas públicas. Ela já foi aprovada em primeiro turno na Câmara dos Deputados, e o projeto deve ser votado novamente no início de agosto, antes de seguir para o Senado.
“A incerteza deve cair com a aprovação da reforma, mas não espero um cenário de explosão de investimentos”, afirma o pesquisador do Ibre. “A incerteza só vai recuar se for consolidada uma relação entre executivo e legislativo (para a aprovação de novas medidas).”
De fato, há um consenso entre os economistas de que a reforma da Previdência, sozinha, não vai ser capaz de trazer um crescimento mais forte e sustentado. O governo vai ter de endereçar uma série medidas, como resolver a questão tributária e melhorar o ambiente de negócios do país, para ajudar na retomada da expansão econômica. “A reforma é importante, mas vamos ter de dar outros passos para a atividade melhorar”, afirma Campelo. G1