O prefeito de Salvador, ACM Neto, minimizou na quinta-feira (28) a possibilidade de uma comissão especial de inquérito investigar eventuais irregularidades na Secretaria Municipal de Saúde. Para ele, não é o momento de “criar um circo” na Câmara de Vereadores de Salvador.

Com a base consolidada, o prefeito não vê chances de uma rebelião entre os edis que possa provocar a comissão. Esse é um exemplo da diferença entre o quadro vivenciado por uma gestão com Executivo forte e uma gestão como a do presidente Jair Bolsonaro, que não consegue arrefecer os ânimos com a Câmara dos Deputados.

O paralelo pode ser absurdo, já que não se compara a administração federal com a de um município. Porém um personagem em comum permite traçar a comparação: o próprio prefeito ACM Neto, que preside nacionalmente o DEM e admitiu a necessidade de um “bombeiro” para diminuir a tensão entre o correligionário Rodrigo Maia e o presidente da República.

ACM Neto sabe que, se o Executivo não conseguir se “impor”, o Legislativo pode torná-lo refém. E também esteve do outro lado da moeda, quando era deputado federal e integrava a oposição a um então popular presidente, Luiz Inácio Lula da Silva.

Lá na metade dos anos 2000, ACM Neto sabia que o embate com um presidente forte provocaria estragos demais e, mesmo fazendo muito barulho, não assistiu ao governo federal subjugar o Legislativo ou vice-versa. A distinção vai para a forma como o presidente da República conduzia uma crise, tal qual Lula, que fazia um tsunami se tornar uma marola, enquanto Bolsonaro, ao invés de acabar com o incêndio, opta por jogar combustível.

Na capital baiana, por mais que haja ruído na base aliada, o prefeito consegue contornar o problema. Tanto que a tentativa de instalação de uma comissão de inquérito era morta desde o nascedouro – ou alguém acreditaria que 29 vereadores aprovariam a criação de um colegiado para investigar uma secretaria do Palácio Thomé de Souza?

E, mesmo havendo reclamações entre os vereadores governistas, dificilmente algum edil iria se insurgir contra um prefeito bem avaliado e cujas relações com a Câmara sempre foram respeitosas. Apesar de ter criticado inicialmente a postura do ex-prefeito João Henrique ao lidar com os vereadores, ele jamais atacou ferozmente o agora desprezível “toma lá, dá cá”.

Já no plano federal, ACM Neto está mais ligado ao outro lado da disputa de poder. Ao comandar o partido dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, é inegável que ele possua certa ascendência sobre os correligionários. Ainda assim, o prefeito de Salvador não conseguiu mitigar as reações dos companheiros de legenda aos rompantes de Bolsonaro.

O exemplo disso foi a aprovação pela Câmara da PEC que imobiliza ainda mais o Orçamento da União e a indicação de que no Senado a votação passará sem ressalvas. O lado prefeito foi contra, mas o lado dirigente partidário foi obrigado a concordar com a postura dos aliados.

Independente dos universos serem completamente diferentes, esse paralelo pode servir para entender mais facilmente o que uma boa articulação política pode fazer. O diálogo é sempre uma alternativa melhor do que a guerra declarada. ACM Neto aprendeu bem isso. Já Bolsonaro está indo mal na fase inicial de aprendizado… Este texto integra o comentário desta sexta-feira (29) para a RBN Digital (Por Fernando Duarte)