Foto : Marcos Oliveira/Agência Senado

Ao apresentar a denúncia por peculato e lavagem de dinheiro contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos), o Ministério Público do Rio de Janeiro também pediu à Justiça para aprofundar a investigação e identificar possíveis novos núcleos e integrantes da suposta organização criminosa. O MP afirma que o então deputado estadual Flávio Bolsonaro chefiava a quadrilha.

O procurador Ricardo Martins, autor da acusação contra o hoje senador, pediu, na denúncia, ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro “autorização para compartilhamento de todos os elementos de prova coletados” para serem usados em outros casos, como forma de abrir novos braços da investigação. A força-tarefa apurou até agora um desvio de cerca de R$ 6 milhões do gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

Segundo o argumento do procurador, há dois focos de atuação e análise de ramificações da suposta organização criminosa. O primeiro é encontrar “envolvidos em eventuais crimes de lavagem de dinheiro praticados nas operações de aquisição da loja Kopenhagen”, no Shopping Via Parque, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio.

O MP quer aprofundar a apuração sobre fraudes “na operação da sociedade Bolsotini Chocolates e Café LTDA”. Segundo a denúncia, Flávio Bolsonaro usou a empresa Bolsotini para, ao lado do sócio Alexandre Ferreira Dias Santini, comprar a franquia da loja de chocolate. Pelo menos outras três unidades da mesma franquia pertencem a pessoas do entorno de Flávio Bolsonaro e de seu ex-assessor, Fabrício Queiroz, que seria o arrecadador de parte dos salários dos servidores do gabinete da Alerj, segundo a denúncia.

Obstrução de Justiça na Alerj

A denúncia contra o então deputado estadual também pede à Justiça que seja aberta uma frente de investigação sobre “a prática, em tese, de crimes de obstrução de Justiça”, envolvendo um servidor ligado à Presidência da Assembleia Legislativa, Matheus Azeredo Coutinho. Matheus é citado na denúncia como figura central de um ato de obstrução de Justiça no dia 14 de janeiro de 2019.

Naquele dia, diz o MP, a ex-assessora de Flávio Luiza Souza Paes, “por orientação do servidor Matheus”, “efetivamente adulterou as provas dos crimes de peculato ao inserir informações falsas em documentos públicos assinando retroativamente os registros de pontos relativos ao ano de 2017, com a clara finalidade de embaraçar as investigações acerca da organização criminosa que desviava recursos públicos pelo esquema das rachadinhas”.

Como o MP afirma na denúncia, grande parte dos atestados de presença no gabinete de Flávio Bolsonaro era feita de forma genérica e global, com um ofício assinado pelo chefe de gabinete, Miguel Braga Grillo, que ocupa a mesma função na equipe de Flávio no Senado. Conhecido como coronel Braga, ele fazia um documento endossando a presença de todos os funcionários de uma só vez – e encaminhava essa carta à Presidência da Alerj. Por esse modelo de abono, os funcionários não precisavam usar os cartões de ponto, comumente usados individualmente por cada servidor.

O G1 apurou que os investigadores do MP trabalham com a hipótese de Luiza, possivelmente pressionada e com ajuda de Matheus, ter tentado preencher cartões de ponto que, até então, estavam em branco, de forma retroativa, eventualmente colocando até faltas. Seria uma forma de assumir a responsabilidade pela sua assiduidade, afastando o crime da alta hierarquia, e dando uma aparência de normalidade ao seu trabalho na Casa. Matheus já foi alvo de buscas pedidas pelo MP.

O rapaz entrou na Alerj como estagiário de administração, em 2017. No dia 5 de setembro de 2018, o atual presidente da Alerj, André Ceciliano, nomeou o rapaz para o cargo de assistente no Departamento de Legislação de Pessoal, que é uma espécie de Recursos Humanos (RH) do Legislativo Fluminense. Após o escândalo da rachadinha, ele foi exonerado. A TV Globo tentou diversas vezes obter da Alerj explicações sobre as suspeitas contra o ex-servidor Matheus Azeredo Coutinho, sempre sem sucesso.

A equipe de reportagem tentou saber se Luiza efetivamente conseguiu adulterar os registros de assiduidade – e apurar quais mudanças teria feito. Fontes ouvidas suspeitam que questionamentos feitos pela imprensa sobre as folhas de ponto do gabinete de Flávio possam ter sido respondidos com dados produzidos após a suposta adulteração feita com auxílio do servidor do RH. A equipe de reportagem também tentou obter registros do trabalho de Matheus, para tentar mapear quais documentos ele acessou, de quais gabinetes – e o que fez com cada um deles. G1