Um militar foi preso na Espanha transportando 39 kg de cocaína. A notícia ganhou as manchetes, principalmente pelo sargento da Aeronáutica integrar a tripulação do avião reserva da comitiva presidencial do Brasil. Algumas lacunas sobre a investigação ainda estão em aberto, porém não faltaram memes e ataques aos ex-presidentes Lula e Dilma e ao atual ocupante do Palácio da Alvorada, Jair Bolsonaro, pela presença desse traficante em voos presidenciais.
É a capacidade do brasileiro de rir da própria desgraça, enquanto continua tapando o sol com a peneira. O primeiro grande problema foi a falta da “qualificação” do sargento preso. Apesar do vice-presidente Hamilton Mourão chamar o militar apreendido na Espanha de “mula qualificada”, foram raros os veículos que o trataram pelo que ele é.
Enquanto alguém detido com uma carga de drogas avaliada em mais de 2 milhões de euros é tratado como “transportador”, a maior parte dos pretos pobres da periferia é rapidamente classificada como “traficante”. Ou o termo é abandonado para todos ou então deve ser usado para todos.
Isso é relevante na discussão? Sim. Porque a imprensa tem um papel relevante na construção discursiva sobre o caso. Se fosse em condições normais de temperatura e pressão, o homem preso seria tratado como “bandido”. Por ter patente militar, há uma “passagem de pano” para evitar que a imagem do órgão seja atingida.
Mas frisemos: a Aeronáutica não tem responsabilidade direta sobre o acontecido, apesar de informações preliminares apontarem que houve falha na fiscalização do comissário de bordo que transportava a droga.
Quanto a Lula, Dilma e Bolsonaro, nenhum tem qualquer responsabilidade sobre o caso, mesmo que o militar preso tenha participado da comitiva presidencial de qualquer um deles. Lula e Dilma sequer estão no governo. Bolsonaro, ainda que esteja no cargo, não pode ser responsabilizado por um crime cometido por outro agente do Estado brasileiro.
É claro que, diante do posicionamento público dele contra as drogas e contra bandidos, o presidente será cobrado de maneira mais incisiva. E isso faz parte do próprio jogo político, quer os bolsonaristas gostem ou não. O que não é admissível é o tipo de provocação feita pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub.
Por meio de um tweet, o membro do primeiro escalão do governo federal comparou Lula e Dilma à cocaína, ao tratar o peso de ambos como “droga”. De certo, o viés ideológico chama atenção em muitas pastas da União e, em muitos momentos, é excessivo.
Há muito se sabe disse, porém é decepcionante cada vez que vemos esse constrangimento em público. Weintraub, mais uma vez, deveria ter se calado. É importante colocar pontos nos “is” em situações como essa. Primeiramente, tratando de maneira igualitária qualquer pessoa que transporte drogas em grande quantidade: traficante.
Segundo, parando de tentar culpar o topo da cadeia por uma falha, ainda que seja absurda. E, não menos importante, entender que a dicotomia entre o anti-petismo e o resto do país não pode servir de desculpa para ataques desvairados. Por Fernando Duarte