Infectologistas criticaram experimentos médicos sem autorização legal no tratamento de pessoas infectadas com Covid-19. Ex-médicos da Prevent Senior, uma das maiores operadoras de saúde do país, denunciaram que foram obrigados a implementar tratamentos sem eficácia e omitir o procedimento dos pacientes e familiares.

Segundo o G1, que teve acesso a um prontuário médico que indicou que um paciente foi submetido a uma sessão de ozonioterapia, por exemplo, prática proibida pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). No “kit Covid”, a empresa teria incluído até mesmo suplementos alimentares, como whey. O Ministério Público também investiga a denúncia de que houve prescrição de flutamida, indicada exclusivamente para o tratamento do câncer de próstata.

“Eu posso falar que desde a Segunda Guerra Mundial, quando a gente normatizou a ética em pesquisa envolvendo os seres humanos, a gente nunca observou tantas aberrações éticas como a gente está vendo hoje no Brasil”, disse Gerson Salvador, infectologista do Hospital Universitário da USP.

“A comunidade científica, a comunidade médica, a comunidade sanitária internacional, sabe como evitar o agravamento da pandemia – são medidas como distanciamento, higiene das mãos, uso de máscaras e imunização. Lamentavelmente no Brasil as mesmas pessoas que defendem tratamentos que não são eficazes, são contra esse tipo de medida”, continuou o infectologista Gerson Salvador.

O coordenador do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), Jorge Venâncio, afirmou que iniciar uma pesquisa sem ter autorização é uma “irregularidade grosseira”, um “retorno às trevas”. “Nesses casos de pesquisa não autorizada a responsabilidade por qualquer dano que exista ao participante é exclusivamente dos pesquisadores da instituição que tiver fazendo a pesquisa.”

Não há indicação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para tratar pacientes com Covid, nem qualquer estudo científico publicado sobre a eventual eficácia desses medicamentos e tratamentos para o coronavírus. Os riscos também são desconhecidos.

“Quando você faz esse tipo de experimentação, o que você está usando não é um ser humano voluntário, o que você está fazendo é tê-los como cobaia. Esse é o exemplo claro do que é uma treva”, disse Jamal Suleiman, infectologista do Instituto Emilio Ribas.

O “tratamento precoce” ou “Kit Covid” tem sido recomendado pelo Ministério da Saúde, a pedido do presidente, desde meados de 2020. Jair Bolsonaro chegou a afirmar no Twitter que o “tratamento precoce” havia sido comprovado por estudos clínicos, postagem que foi marcada pela rede social com o alerta de que se tratavam de “informações sem comprovação”.