Dos candidatos que deverão concorrer a governos estaduais no país em 2022, ACM Neto (DEM) será provavelmente aquele que enfrentará a campanha mais desafiadora e difícil de conceituar para capturar, ampliar e fidelizar o eleitorado. O democrata, de fato, representa o que pode ser considerado a grande novidade na próxima sucessão estadual, em contraponto qualitativamente vantajoso e nítido ao seu principal adversário, o senador Jaques Wagner (PT), facilmente identificável com a idéia não apenas de continuidade (petista) mas de saída ou retorno a um passado sobejamente conhecido.

Neto surge em campo depois de uma experiência exitosa como prefeito de Salvador por dois mandatos, por meio dos quais pode comprovar competência também no plano da gestão, intercalados por uma reeleição que consagrou sua popularidade na capital baiana e levou o eleitorado a premiá-lo com a entrega da Prefeitura, quatro anos depois, ao correligionário e amigo Bruno Reis (DEM), em 2020. Aliadas ao nome que remete ao avô, que porta como uma espécie de grife e facilita sua penetração no Estado, são credenciais bastante favoráveis ao projeto de conquistar o governo.

A princípio, os atributos chegaram a permitir a sensação, principalmente entre seus aliados, de que só uma reviravolta poderia lhe tirar do destino o Palácio de Ondina no ano que vem. Mas o Supremo Tribunal Federal (STF) restituiu os direitos políticos ao ex-presidente Lula (PT), que hoje, segundo as pesquisas, aparece como franco favorito para derrotar o projeto de reeleição do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no país e deve alavancar as candidaturas aliadas nos Estados durante a campanha por um fenômeno conhecido por estas bandas pelo nome de eleição casada.

Na Bahia, Wagner trabalha com a ideia de ser o principal beneficiário do modelo, no qual o eleitorado se concentra na disputa presidencial e descarrega votos nos candidatos que cada presidenciável apóia em seu respectivo Estado, colocando em segundo plano o papel fundamental que as lideranças locais deveriam ter no enfrentamento dos problemas regionais. O fenômeno é conhecido do petista não só por ter garantido sua primeira eleição, em 2006, como a renovação do seu mandato de governador, em 2010, e a dupla vitória do sucessor Rui Costa (PT) ao governo da Bahia – em 2014 e 2018.

Num contexto de acirramento da polarização entre Lula e Bolsonaro, a expectativa é de que a disputa presidencial congregue todas as atenções, o que exigirá de Neto um esforço redobrado para tentar regionalizar a campanha e manter o foco dos eleitores no conteúdo de suas mensagens. Só parte do problema decorre de ele não querer se aproximar de forma alguma do presidente, que deve lançar um candidato ao governo para garantir um palanque na Bahia. Como é público, falta a Neto a mínima identidade com a sua figura – o que é, aliás, além de justificável, elogiável -, mas também lhe sobra informação de que está difícil Bolsonaro deslanchar por aqui. Artigo do editor Raul Monteiro publicado na edição de hoje da Tribuna.