Depois de uma extensa discussão, com apresentação de posições divergentes e falta de acordo na sessão de terça-feira (3), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), retirou de pauta e adiou a votação do projeto de lei complementar (PLP 192/2023) que muda as regras de inelegibilidade. Pacheco atendeu a pedido do relator do projeto, senador Weverton (PDT-MA), e de outros líderes, e a proposição só deve retornar à pauta do Plenário após as eleições municipais, em 6 de outubro.
O texto do PLP 192 unifica em oito anos o prazo em que os candidatos ficam impedidos de disputar eleições por condenação judicial, cassação ou renúncia de mandato. Pelas regras atuais, há pelo menos cinco situações em que o impedimento para disputar eleições pode ultrapassar oito anos. O projeto unifica o período de inelegibilidade com esse prazo.
A proposta recebeu diversos destaques e emendas de senadores, e o relator, ao argumentar pelo adiamento da votação, disse que precisaria de maior tempo para analisar possíveis mudanças no seu relatório. Alguns líderes pediram a Pacheco que o projeto só seja votado em sessão presencial (nesta terça o Plenário se reuniu em caráter semipresencial).
O PLP 192/2023 estabelece um teto para limitar o acúmulo de períodos de inelegibilidade de um mesmo candidato. Caso uma pessoa já impedida de disputar eleições seja condenada a novos impedimentos, o prazo total fica limitado a 12 anos.
Na discussão do projeto na tarde desta terça, um dos pontos do projeto que gerou maior controvérsia foi o dispositivo que trata de casos de abuso do poder econômico ou político. De acordo com o texto, ficam inelegíveis pessoas condenadas “por comportamentos graves aptos a implicar a cassação de registros, de diplomas ou de mandatos, pela prática de abuso do poder econômico ou político”.
Para senadores críticos do projeto, da forma como está, o trecho da proposição poderia favorecer políticos como o ex-presidente da República Jair Bolsonaro, que não teve registro cassado, embora tenha sido declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até 2030.
Na decisão do Tribunal Superior Eleitoral que tornou Bolsonaro inelegível, o ministro Benedito Gonçalves, acompanhado por unanimidade pelos demais ministros da Corte, destacou que não seria aplicada a “cassação do registro de candidatura dos investigados, exclusivamente em virtude de a chapa beneficiária das condutas abusivas não ter sido eleita”.
Em entrevista recente, o jurista Márlon Reis, um dos autores da Lei da Ficha Limpa, disse que a redação do PLP 192/23 abrirá uma margem clara para Jair Bolsonaro solicitar a reconquista da elegibilidade já para 2026, uma vez que o ex-presidente não foi cassado.
“No julgamento que o afetou, o acórdão focou exclusivamente na configuração do abuso de poder, uma vez que não se tratava de uma ação capaz de gerar a cassação de diplomas ou mandatos. Com a nova redação, o argumento de que a inelegibilidade só deve incidir quando houver efetiva cassação poderia ser explorado pela defesa, visando a reverter a situação de inelegibilidade”, afirmou Reis.
Durante a votação do projeto, o líder do PSD, senador Otto Alencar (BA), criticou a proposta, e disse que ela busca mudar a Lei da Ficha Limpa para beneficiar quem agiu errado mesmo conhecendo a legislação. O senador baiano disse que votará contra o projeto, e que, para ele, o Congresso não deveria estar mudando uma lei que prestou tantos benefícios à nação.
“Todos que erraram tinham o dever de conhecer a Lei da Ficha Limpa. Ninguém errou porque não conhecia a lei, a lei está posta. Para que existe a lei? A lei existe para limitar o poder, o meu e o seu. A lei existe para circunscrever o poder do presidente do Senado, do governador do estado, do presidente da República. A todos nós o dever de conhecer a lei é dado. Ninguém chega a uma Câmara de Vereadores, a uma Prefeitura, ao Governo do estado sem o conhecimento da lei. Quem errou aqui, errou sabendo que estava ao arrepio da lei. Modificar a Lei da Ficha Limpa é um desserviço à nação”, disse o senador Otto Alencar. Bahia Notícias