Agência Brasil

Em meio à crise de saúde no país, a parcela das famílias endividadas bateu recorde pelo segundo mês seguido. Sem alcançar os preços mais altos na prateleira, espremida entre o que ganha e o que precisa gastar, está a maior parte das famílias brasileiras. Na Pesquisa Mensal da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo, sete em cada dez famílias no país dizem que chegaram ao mês de agosto com dívidas. É o segundo recorde seguido na série histórica.

Uma família trocou o carrinho da compra do mês pela cestinha das primeiras necessidades. E não tem mais o que cortar da lista. “Não dá, porque a gente tem filhos. Eles precisam se alimentar e a gente não sabe o que faz. A gente está esticando o que pode. Está difícil”, diz a administradora Andrea de Oliveira. Foi assim que ela mudou também a forma de pagamento do supermercado.

“Se não fosse o cartão de crédito, a gente não tinha nem como condições de arcar porque não tem o dinheiro no momento”, afirma. Outro recorde alarmante da pesquisa: entre as famílias endividadas, 83,6% citaram o cartão de crédito como modalidade de dívida. E para as famílias com ganhos mensais inferiores a dez salários mínimos, a parcela é ainda maior: 84,3%, o nível mais alto da história da pesquisa para essa faixa de renda.

“O que está acontecendo é que a inflação está tirando um espaço do consumo, do dinheiro, dos recursos dessas famílias, e isso está fazendo com que as pessoas cheguem ao fim do mês sem recursos para continuar consumindo aqueles itens de primeira necessidade”, explica a economista Isis Ferreira, da Confederação Nacional do Comércio. A refeição do dia, o combustível que leva até a entrevista de emprego, a conta de luz mais cara, tudo isso consome parte importante da renda da população. Resta parcelar o dia a dia à taxa média do cartão: 300% ao ano

Esse é o tipo de dívida que pesa para o consumidor e para a economia do país. Tantas famílias sem dinheiro à vista para o básico é um sinal claro de desequilíbrio não só no orçamento das casas, mas dos principais indicadores econômicos brasileiros. Pesam nessa conta a inflação, o desemprego e a queda da renda da população. Os economistas dizem que, no futuro, quando a fatura chegar, pode faltar dinheiro para consumo e investimento. O que só atrasa o fim dessa crise. O economista Joelson Sampaio, da Fundação Getúlio Vargas, explica que a alta dos juros para conter a inflação vai deixar ainda mais caro esse passivo lá na frente.

“Quando nós olhamos o aumento do endividamento e em paralelo o aumento da taxa de juros, isso acaba comprometendo a capacidade principalmente de honrar esses compromissos no futuro, e certamente pode afetar a economia brasileira sim”, diz. E a administradora Andrea de Oliveira saiu sem saber se foi ela que empobreceu ou o supermercado que mudou: “A alimentação, como o arroz e o feijão, que é o básico do básico, nem isso a gente está salvando mais.” G1