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O percentual de abstenção nesta eleição cresceu principalmente entre os eleitores jovens e entre os idosos. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a taxa geral do Brasil ficou em 23,1%, cerca de seis pontos percentuais acima do registrado há quatro anos. O recorte por faixa etária mostra, contudo, que os eleitores de 17 a 24 anos e aqueles de 65 a 84 anos apresentaram uma variação maior em pontos percentuais no comparativo com a abstenção de 2016. Com isso, eles lideram o aumento nos percentuais de abstenção neste ano.

Para especialistas, parte desse comportamento pode ser explicado pelo contexto da pandemia, mas também por fatores associados ao comportamento político desses dois grupos. Entre todas as faixas etárias, os eleitores de 17 a 24 anos apresentaram aumento da abstenção de 6 a 12 pontos percentuais no comparativo com 2016. Cerca de 20% dos eleitores com 17 anos deixaram de votar neste ano contra 13,5% da eleição passada. O índice da abstenção passou de 24% entre aqueles com idade entre 21 e 24 anos. Há quatro anos, foi menor que 18%.

No outro extremo, eleitores entre 65 anos e 84 anos registraram aumento de 10,4 a 16,7 pontos percentuais no comparativo com 2016. No grupo dos eleitores entre 70 e 74 anos, por exemplo, a taxa chegou a 54,5% neste ano contra 37,9% em 2016. As demais faixas etárias, que vão de 25 a 64 anos, também apresentam aumento, mas em um patamar menor, entre três e cinco pontos percentuais quando comparadas com 2016.

Em números absolutos, mais jovens foram votar

Outro dado apresentado pelo TSE nesta semana e que chama a atenção é o total do comparecimento dos mais jovens. Em números absolutos, a faixa dos eleitores de 16 anos a 18 anos apresentou um comparecimento maior. Mais de 1,8 milhão de jovens de 17 anos, por exemplo, foram votar neste ano, número acima do 1,2 milhão registrado em 2016. Apesar do aumento, isso não foi suficiente para manter estável ou reduzir o percentual de abstenção desse grupo porque mais jovens também deixaram de ir votar.

Não obrigatoriedade do voto e pandemia

Na avaliação do professor de ciência política da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Emerson Cervi, o aumento do número absoluto de jovens que compareceram para votar pode ter relação com a campanha realizada pelo TSE em 2019 e que procurou estimular o alistamento eleitoral. Ele chama a atenção para a não obrigatoriedade do voto abaixo de 18 anos, o que já explicar a abstenção maior nesse grupo, mas ressalta que houve aumento também fora dessa faixa.

“Ao que tudo indica, a campanha do TSE para alistamento eleitoral de jovens surtiu efeito. Agora, a abstenção antes dos 18 anos deve ser considerada à luz da não obrigatoriedade. As duas faixas em que o comparecimento não é obrigatório são as que apresentam maiores proporções de abstenção. Ainda assim, a proporção de abstenção entre 20 e 25 anos foi maior em 2020 do que a proporção de abstenção entre 16 e 17 anos”, destaca Cervi.

Já o professor de ciência política da Universidade Estadual de Maringá (UEM) Ednaldo Ribeiro considera que o aumento entre os mais idosos pode ter relação com a pandemia provocada pelo Covid-19. Ele lembra ainda que há uma tendência de aumento geral da abstenção desde 2006.

“A relevância desse fator (pandemia) fica clara quando confirmamos que as maiores variações negativas nas taxas de comparecimento ocorreram nos grupos etários com maior risco de agravamento em caso de contaminação. Merece destaque a faixa que vai dos 70 aos 74 anos, na qual a abstenção vai de 37,9% para 54,5%. As facilidades para justificar a ausência nesse contexto de pandemia devem ser consideradas também na explicação dessas taxas”, acrescenta Ribeiro.

Para o professor da estadual de Maringá, as maiores taxas de abstenção entre os mais jovens e os idosos, registradas inclusive em outras eleições, são explicadas por alguns fatores que influenciam o comportamento político, entre eles o que os pesquisadores chamam de “ciclo da vida”, ou seja, a disposição para participar dos pleitos varia em cada etapa da vida biológica e social dos indivíduos.

“Aqueles que combinam a inserção no mercado de trabalho com a formação de um núcleo familiar próprio são os mais propensos ao comparecimento. Como se trata de um ciclo, é importante salientar que a participação tende a reduzir também quando ocorre a saída do mercado de trabalho e o enfraquecimento dos laços familiares, fazendo com que idosos também deixem de comparecer”, explica Ribeiro.

Segundo o professor, outra hipótese para explicar as taxas de abstenção maiores entre jovens e idosos refere-se à mudança cultural que vem ocorrendo em diversos países, e não apenas ao desencanto ou desilusão com a política.

“Enquanto os jovens tendem a valorizar atividades políticas ligadas à auto expressão, como os protestos e o ativismo online, os mais velhos tendem a utilizar os canais tradicionais, como o voto. Ainda que o desencanto com a política tradicional seja documentado em todas as faixas, essa diferença nas preferências por distintas formas de atuação política deve ser considerada. Em conjunto, essas duas hipóteses podem nos ajudar a entender essas diferenças entre as faixas, que ultrapassam a desilusão ou desencanto”, afirma Ribeiro. G1