O ser humano é político por natureza. Platão falava sobre isso na Grécia antiga, quando cunhou que aqueles que não gostam de política serão governados pelos que gostam. No entanto, alguns temas não deveriam ser politizados. Um exemplo é a prescrição de remédios. No meio de uma crise sanitária, o Brasil vive subcrises a partir da politização de um direito médico de escolher qual o melhor tratamento para um paciente contra novo coronavírus.

Tudo começa com a falta de informação sobre tratamentos testados e eficientes para a Covid-19. Até aqui, nenhuma droga se mostrou completamente eficaz contra a doença. Algumas inclusive com a pesquisa descontinuada, como é o caso da cloroquina/ hidroxicloroquina. Junto com azitromicina, ivermectina e tantas outras salvações da lavoura que foram aos poucos perdendo espaço nos meios médicos. Todavia, ainda há uma constante de defesas desses medicamentos no enfrentamento ao coronavírus, baseadas mais em visões políticas do que científicas.

A bola da vez são os “kit-Covid”, distribuídos por prefeituras e até mesmo por grupos da sociedade civil. Mesmo sem qualquer recomendação específica por parte de conselhos e sociedades médicas, há uma verdadeira indústria de propagação de que é possível conter o avanço da Covid-19 a partir do uso profilático ou em fases iniciais de medicamentos como cloroquina, azitromicina ou ivermectina.

De um lado, aqueles que acreditam que as substâncias funcionam, ainda que a ciência não dê garantias. Do outro, os mais céticos que insistem no cuidado antes da prescrição dos remédios. Entre as duas disputas narrativas, uma população mal informada que, infelizmente, não tem a quem recorrer. O resultado é um clima de desconfiança geral, que obriga parte da comunidade médica a reagir de maneira política, algo que em outros contextos não aconteceria.

Não é uma questão de certo ou errado. Medicina não é uma questão de fé há muito tempo, por mais que existam charlatões aos montes a propagar que a cura exclusiva pela fé existe. Porém é preciso ter cautela para evitar que essa disputa política não cause danos ainda mais graves do que a crise do coronavírus em si. Receitar medicamentos é uma prerrogativa médica. Mesmo que o presidente da República sugira o contrário… Por Fernando Duarte/Bahia Notícias