O Brasil chegou nesta última terça-feira (17), a 55,58% da população vacinada com pelo menos uma dose de vacina contra a Covid-19, segundo dados do consórcio de veículos de imprensa. O percentual é equivalente ao de países que começaram a vacinar mais cedo, como os Estados Unidos, que têm 59% de vacinados com ao menos uma dose. No entanto, apenas 24,36% dos brasileiros estão totalmente imunizados, seja com a segunda dose das vacinas Coronavac, AstraZeneca e Pfizer, seja com a dose única da Janssen.

Já nos EUA quase todos os vacinados já completaram o esquema vacinal. O percentual é de 50%. Especialistas afirmam que a disparidade entre primeira e segunda doses no Brasil se deve a uma série de motivos, como a falta de campanhas de conscientização e busca ativa pelos governos, falta de vacinas e problemas no planejamento e o ritmo da vacinação.

Veja a lista dos motivos:

  • Falta de campanhas e busca ativa para segunda dose
  • Falta de vacinas e incerteza no planejamento
  • Atrasos no registro dos dados de vacinação
  • Prazo de 3 meses entre as aplicações das doses da AstraZeneca e Pfizer
  • Ritmo de vacinação diferente

Eles alertam também que a primeira dose das vacinas já tem efeitos no combate ao vírus, mas ainda é insuficiente para combater a transmissão e casos leves. Por isso, as restrições não devem ser totalmente relaxadas e os cuidados devem ser mantidos.

Falta de campanhas e busca ativa

“A gente não tem nenhuma campanha de comunicação oficial pra falar da importância da segunda dose”, afirma a professora da Ufes e doutora em epidemiologia Ethel Maciel. “Estamos nós pesquisadores e a imprensa falando, mas, enfim, a gente não tem os nossos órgãos oficiais, o Ministério da Saúde, fazendo campanhas publicitárias.”

Além disso, segundo a especialista, não há uma busca ativa das pessoas que tomaram a primeira dose para quem voltem e completem o esquema vacinal. Esse trabalho devia ser feito pelos municípios, com o contato direto dos parcialmente imunizados, mas não é adotado de forma generalizada ao redor do país, diz.

Falta de vacinas e incerteza no planejamento

As interrupções no fornecimento da vacina ao longo dos últimos meses, a falta de previsão de estados e municípios do número de doses a serem recebidas e das datas de envio criaram incerteza tanto para os municípios quanto para os cidadãos, afirma Ethel.

“Com a desorganização da campanha no Brasil, a falta de imunizante, a pessoa já não tem um agendamento automático, ‘tem que vir tal dia’, não. Na maioria dos estados, tem que marcar, tem que ter acesso a internet, nem sempre é simples.”

“Então, todas essas barreiras foram colocadas, porque a gente não tinha dose. E aí você não sabia se ia ter dose naquele dia que está marcado. A pessoa tem que entrar no site de novo, reagendar para tomar a segunda dose. Vão sendo criadas barreiras. Não é só chegar na unidade de saúde e se vacinar.”

Atrasos no registro dos dados de vacinação

O pesquisador Marcelo Gomes, do Programa de Computação Científica da Fiocruz, ressalta também que parte da diferença se deve aos atrasos nos registros de vacinação. “O dado de vacinação é sempre muito atrasado em relação à aplicação em si”, afirma. “O dado recente está sempre subrepresentado.” Como as segundas doses foram aplicadas mais recentemente, tendem a ser mais afetadas por esses atrasos que as primeiras doses dadas semanas ou meses antes.

Prazo mais longos

Outra diferença destacada pelos especialistas está nos intervalos adotados pelo Brasil para as vacinas AstraZeneca e Pfizer. A bula da AstraZeneca, que responde por quase metade das doses aplicadas na população brasileira, recomenda intervalo de 4 a 12 semanas. O Ministério da Saúde adota 12 semanas, já que a vacina oferece proteção parcial de 76% já 21 dias após a primeira aplicação. No Reino Unido, o intervalo adotado foi de quatro semanas.

Alguns estados brasileiros, no entanto, estão reduzindo este prazo para aumentar a proteção contra a variante Delta. No caso da Pfizer, uma das vacinas mais aplicadas nos Estados Unidos, o fabricante recomenda o intervalo de 21 dias, assim como a Organização Mundial de Saúde (OMS). O Brasil, no entanto, preferiu estabelecer 12 semanas entre as doses, justificando que é o mesmo adotado pelo Reino Unido.

Ritmo de vacinação diferente

O infectologista Marcelo Otsuka, coordenador do Comitê de Infectologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Infectologia, afirma que a disparidade é explicada também pelo ritmo de vacinação. Países como EUA, Reino Unido e Israel avançaram rapidamente no início do ano, chegaram a um patamar e estacionaram. Ao longo dos meses, a segunda dose foi avançando também e foi aplicada na maioria dos vacinados.

Já o Brasil começou lentamente a vacinação, por falta de doses, e nos últimos meses registrou um salto nas aplicações. “Em alguns países, o ritmo de vacinação até foi maior no início e diminuiu com o tempo. Então, as pessoas que tomaram vacina mais rapidamente tiveram tempo de tomar a segunda dose. No Brasil aconteceu exatamente o oposto, nós tivemos um ritmo muito lento inicial de vacinação. E agora que a gente teve um boom de vacinação mais importante”, explica.

“Os Estados Unidos, por exemplo, atingiram esses 50% há muito tempo”, diz. “Mas eles pararam de progredir.” Otsuka não acredita que o mesmo aconteça no Brasil. “Acho bem menos provável. Não (acho que vai acontecer) na escala de outros países.”

Discrepância nos estados

Entre os estados brasileiros, São Paulo é o que tem o maior percentual de pessoas com pelo menos uma dose de vacina: 68%. É também o que tem a maior disparidade em relação à segunda dose. Ao todo, 29% dos paulistas foram totalmente imunizados. O Mato Grosso do Sul é o que tem o maior número de totalmente imunizados: 38%. Com pelo menos uma dose são 58%. G1