EC Vitória

Após duas semanas de atividades em grupo, ao vivo, através de plataformas digitais, o preparador físico do Vitória, Ednilson Sena, fez um balanço dos treinos e do condicionamento dos jogadores rubro-negros. Em entrevista ao Correio, ele falou sobre o desafio de coordenar 34 atletas à distância durante a pandemia de covid-19. “A gente teve que se reinventar. Não é o que nós gostaríamos de fazer, mas é o que o momento nos proporciona”, pontuou.

O clube disponibilizou aos atletas exercícios físicos individuais em vídeo desde que as atividades na Toca do Leão foram suspensas, em 17 de março, mas a partir do último dia 11 os treinos passaram a reunir todo o grupo, sempre pela manhã, de segunda a sábado. O clube aguarda liberação das autoridades governamentais para reabrir o centro de treinamento.

Qual é o balanço que você faz das duas primeiras semanas de treinos virtuais ao vivo?

A gente está tendo uma melhora significativa. A gente está melhorando o nível de força, de equilíbrio. A gente está tendo um ganho. Não é o ideal, mas nós estamos preparando a musculatura dentro das limitações de espaço físico. Nós estamos trabalhando a intensidade, fazendo trabalho de potência. Graças a Deus está sendo bastante produtivo o trabalho, que dura em torno de uma hora. Está bacana e nós preparadores físicos estamos aproveitando para nos condicionar também, pois a gente executa também uma parte do trabalho, até pra gente ver como é que está o nível de intensidade do trabalho. O elenco do Vitória sabe o que quer, está focado e tem rendido bons frutos. Não é o ideal, mas nós estamos nos preparando para que, quando tiver autorização para treinos presenciais, a gente esteja num nível melhor.

Quais são os principais desafios desse treinamento virtual?

A maior dificuldade é a distância, o espaço físico e o material de trabalho. O atleta está com saudades de estar junto, de bater na bola, finalizar, dar um pique de 30 ou 40 metros, fazer lançamento, marcação. Tudo isso dificulta pela inatividade. Quando mais você trabalha, mais você melhora. A inatividade, em qualquer profissão, deixa você com um nível baixo. Além da parte física, tem o psicológico, o emocional. O jogador ele vive da bola, do campo. Hoje, você está se reinventando. Acredito que as pessoas que militam no futebol todas terão que se reinventar pela dificuldade.

Houve novo ânimo após iniciar os treinos em grupo mesmo que virtualmente?

Com certeza. Eu marco 9h, mas a gente abre a plataforma antes. Precisa ver quando um dá bom dia para o outro a felicidade de cumprimentar o outro, mesmo à distância, as brincadeiras. Isso é muito salutar, aumenta a autoestima do atleta. Eu deixo aquele momento ali, que é o bobinho no trabalho presencial, que é o trabalho onde se tem uma interação entre os atletas, eles gostam muito daquele momento de descontração, até para dar uma relaxada e se prepara para o início do trabalho.

Como vocês estão equilibrando a diferença de espaço físico que os atletas têm em cada casa?

Eu determino um espaço físico pra eles. Quem tem cinco metros, faz com cinco, quem tem 10 metros, faz com 10, quem tem três metros tem que fazer também. Eles puxam o sofá da sala, ajeitam a mesa. Aqueles que são casados, com o auxílio de suas esposas, já prepararam o cantinho do treinamento deles. Algumas atletas têm filho e ficam do lado imitando o pai fazer a atividade. Eu digo para ficar tranquilo, pois aquilo serve como motivador para o grupo. A família é nosso alicerce.

Quantos atletas estão com nível de condicionamento físico dentro do esperado e quantos estão abaixo disso?

É complicado, porque a gente precisaria testar para mensurar e, como estamos à distância, todos estão no mesmo nível. A gente sabe que alguns têm um foco maior, que vai correr, que acha que precisa de algo mais e, às vezes, até seguramos esses atletas, porque um treinamento a mais pode causar até uma lesão muscular. A gente tem que fazer tudo certinho para correr o mínimo de risco possível. Eles estão num bom nível.

Os treinos virtuais vão acontecer até quando?

Vai ser programado semanalmente. Enquanto tiver essa paralisação, nós vamos nos reinventando. O trabalho não para. Nós temos metas e vamos aumentando a carga, a intensidade. Nosso planejamento está pronto só esperando um feedback dos órgãos competentes.

Quais dos jogadores que estavam machucados quando a pandemia começou já estão nesse momento fazendo o trabalho junto com todo mundo?

Só não o Martín (Rodríguez, goleiro), porque foi uma lesão de ligamento cruzado. Ronaldo, Juan Levine, Jordy, Fernando Neto. Todo mundo participando, com exceção de Martín Rodríguez. Foi montado um trabalho para ele com fisioterapeuta e fisiologista pra melhor o tônus muscular.

O Jordy Caicedo é o único jogador do elenco que está fazendo trabalho físico no CT? Por que?

No momento, esse trabalho específico, sim. Para os outros já não é mais necessário. Eles já vinham em uma fase bem adiantada quando teve a parada total e hoje estão no mesmo nível do grupo. Jordy estava mais atrasado, porque ele fez uma cirurgia de púbis e ele está fazendo trabalho de resistência, de velocidade, mudança de direção, específico da parte física. Quando você faz essa cirurgia de púbis, você tem um travamento, digamos assim, da musculatura. Ele precisa fazer trabalhos específicos para melhorar o nível dele. Nosso objetivo é que, quando o grupo voltar aos treinamentos presenciais, Jordy já esteja apto a ir junto com o grupo.

Como vão acontecer os treinos físicos quando o grupo voltar à Toca do Leão?

A primeira coisa quando tiver a liberação será testar todo o grupo. Serão feitos testes da covid-19 em profissionais, atletas e familiares, porque não adianta testar os atletas e não testar os familiares, já que ele vai voltar para o lar. O atleta vai sair da casa dele sozinho para o treinamento. Ao chegar, vai ser medida a temperatura. Tá, ok? Entra em campo para treinar, com luva, máscara. Acabou o treinamento ele pega o seu material e volta pra casa dele. Ele vai ter a garrafa dele individual, a suplementação, vai ter que levar a garrafa. Para que corra o mínimo de risco. A gente vai trabalhar à distância, de 8 a 10 metros no campo. Tá tudo planejado para o retorno, só depende da liberação. Pelo protocolo da CBF, você pode trabalhar quatro atletas por metade campo. Aí você vai ver sua necessidade e se vai ter como conduzir. A gente tem que fazer o trabalho e correr o mínimo de risco. Nós estamos vendo se vamos trabalhar com 16 atletas, porque vamos trabalhar em dois horários. A gente está vendo ainda como é que vai ficar o primeiro momento. Primeiro vamos treinar em dois campos, nos dois principais do CT. Dependendo como o trabalho for sendo avaliado, vamos incrementá-lo. A gente planeja, mas tem que ver como vai surtir na prática.

Quais são os prejuízos da inatividade na performance de um jogador de futebol?

A gente sabe que o tempo pra um atleta de qualquer modalidade esportiva é complicado. Isso nunca aconteceu. Mais de 60 dias sem ter uma atividade de trabalho coletivo, de finalização, aprimoramento tático, reforço muscular. Quando fica muito tempo sem fazer uma atividade, você perde muita valência física, perde força, velocidade, resistência, potência, um pouco da velocidade de reação, visão periférica. Quanto mais você trabalha, automaticamente você melhora seu nível.

Como você acredita que estará o preparo físico dos atletas quando os jogos forem retomados?

Vai ser muito mais delicado do que em começo de temporada. Você está vendo grandes equipes, com grandes estruturas, em que jogadores estão machucando em treinamento diário. A gente tinha maior número de lesão em contato de jogos. No campeonato alemão, em seis jogos, tiveram oito lesões musculares. Isso é pela inatividade. Jogador quando sai de férias em dezembro ele tem 30 dias, mas ele não tem nenhuma limitação. Tem o baba de Pedro, de João, joga futevôlei, faz academia, corre. Tem várias atividades que esses atletas se mantém aptos. Acredito muito que vai dar certo, mas vai ser um momento delicado, as pessoas vão ter que entender que não será como um retorno de temporada de um ano para o outro. O tempo é bem maior. Não são 30 dias ativos, são mais de 60 já inativos.

A permissão para fazer cinco substituições ajudará?

Ameniza, porque você sabe que você vai ter que ter mais atletas inteiros para substituir, porque o desgaste vai ser muito grande. A gente não sabe nem como vai ser o calendário. Imagina jogo quarta e domingo, com translado. Correio da Bahia