Foto: Laiá Films

Sem conseguir emprego desde que concluiu a faculdade, há um ano, Andrielle Antonia dos Santos de Jesus recorreu à poesia para colocar para fora seu desespero. E transformou seu currículo em versos e rimas. A repercussão foi grande, e a professora de história de 25 anos foi chamada para entregar seu currículo formal e até para entrevista em algumas escolas.

“Não imaginava a repercussão que ganharia. Eu escrevi para desabafar, me sentir melhor. O desemprego afetou minha autoestima. Eu perdi, de certa forma, minha independência. E isso mexeu muito comigo”, conta.

A moradora de Santo Antônio de Jesus, no recôncavo baiano, conta que fez o poema no dia 5 de novembro e o compartilhou num grupo de WhatsApp de amigas escritoras negras. Elas gostaram tanto que deram a ideia de colocá-lo em forma de cartão para ser divulgado.

Poema feito por Andrielle para mostrar seu desejo de arrumar emprego — Foto: Arquivo pessoal

No mesmo dia, Andrielle fez toda a arte do cartão e o enviou para sua rede de amizades, que acabaram encaminhando para possíveis empregadores. E alguns deles pediram seu currículo formal. Por enquanto, a professora fez uma entrevista, em uma escola particular de educação infantil, que no momento está com o quadro de professores completo.

“Todos falaram que gostaram muito do meu currículo e que, provavelmente, haverá vagas no próximo ano”, conta. A recém-formada tem como experiência estágios realizados na rede municipal de ensino durante dois anos.

Em sua cidade ela já entregou o currículo em 15 escolas – em três delas a pedidos. Andrielle ainda conta com ajuda de amigos, que enviam seu CV por e-mail para diretores e coordenadores e também distribuem o documento em outras cidades da região como Amargosa, Mutuípe e Jiquiriçá. “Às vezes, tenho a sensação de que nem olham o currículo, jogam fora. Infelizmente, ainda conta muito ter alguém que indique”, lamenta.

Além de contar com ajuda para envio do seu currículo, uma professora de São Miguel das Matas se ofereceu para pagar a taxa de inscrição de R$ 100 do concurso público que Andrielle vai prestar, que oferece 2,4 mil vagas na rede estadual de ensino.

A professora de história ainda tem lutado contra o avanço de uma doença degenerativa da córnea, o ceratocone, cujo tratamento para ela é caro. E Andrielle novamente recorreu à escrita para lidar com o problema e criou um blog para falar sobre o assunto. Ela também conta com uma rede de apoio para ajudá-la no custeio das despesas do tratamento que incluem trocas de lentes de contato e viagens para exames e consultas em municípios vizinhos.

“A visibilidade do pedido de emprego trouxe inúmeras coisas boas, apesar de ainda não ter conseguido um emprego. Pessoas dispostas a me ajudar, uma rede de afetividade”, diz.

Apesar das dificuldades por que tem passado, tendo que depender da mãe e da avó e de alguns bicos de correções de trabalhos acadêmicos e pesquisas para sobreviver, Andrielle está otimista sobre seu futuro. “Eu sou esperançosa. Eu acredito que existem muitas pessoas boas no mundo, mesmo com tantas notícias ruins. Por isso, tenho certeza que momento certo o emprego certo irá surgir.”

A recém-formada Andrielle Antonia se diz otimista com o mercado de trabalho — Foto: Laiá Films (@laiafilms); Edgar Azevedo (@edgarazevedo) e Rafael Zu (@rafaelzuanny)

Foto: Laiá Films (@laiafilms); Edgar Azevedo (@edgarazevedo) e Rafael Zu (@rafaelzuanny)

Estratégia pode dar certo, diz consultor de carreiras

E como a iniciativa de Andrielle é vista por quem recruta para vagas de emprego? Segundo o consultor de carreiras Roberto Recinella, a estratégia da professora deu certo e ela alcançou justamente as escolas que valorizam o perfil dela. Mas, em geral, o resultado sempre vai depender do recrutador e da empresa.

“O recrutador que não gostasse provavelmente não seria de uma empresa onde ela se daria bem”, explica.

Para Recinella, esse tipo de divulgação do currículo demonstra criatividade, proatividade e flexibilidade. “Eu particularmente gosto desse tipo de ousadia, outros podem ver de forma crítica. Mas o mundo está mudando e uma nova geração está entrando no mercado com um linguajar e um modo de pensar diferente”, afirma.

O consultor explica mensagens que chamam muito a atenção das pessoas e têm um grande alcance nas redes sociais sempre acabam chegando a um número grande de recrutadores e empresas, gerando um “chamado” das empresas.

Mas ele ressalta que o candidato deve ter pronto seu currículo tradicional em caso de ser chamado para algum processo de seleção – a não ser que o recrutador o dispense disso.

Segundo o consultor de carreiras, a divulgação criativa, na maioria das vezes, apenas dá mais visibilidade ao candidato, então ele deve estar preparado para passar pelas próximas etapas do processo. E ser chamado não significa ser contratado. “Lembre-se de que você criou expectativas no recrutador, então esteja pronto para estar à altura delas”, salienta.

Veja dicas de Recinella para o currículo tradicional:

  • Mantenha o currículo atualizado – não basta espalhar o currículo pela web e depois abandoná-lo. Crie o hábito de rever seu currículo regularmente nos sites em que o publicou
  • Mantenha os dados de contato e competências em dia
  • Descreva a sua área de atuação e formação
  • Seja sucinto e direto ao colocar as suas qualificações, conquistas e cursos
  • Mostre que você alcança resultados através de suas conquistas
  • Esteja atento à gramatica
  • Simplicidade é essencial. Menos é mais. Informações do G1