Em aceno ao presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), os principais cotados atualmente na disputa pela presidência da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e João Campos (PRB-GO) querem mudar as regras da Casa para facilitar a tramitação da agenda do novo governo a partir de 2019. Os dois deputados disputam os votos da base bolsonarista para chegar ao comando da Câmara em fevereiro do próximo ano.

 

O chamado “kit obstrução” é um conjunto de ferramentas utilizada por opositores de algum projeto que estejam em minoria para tentar dificultar votação dos projetos. Siglas como PT e PSOL já planejam estratégias para adiar ao máximo a agenda legislativa do governo Bolsonaro. Ela incluirá propostas como a flexibilização do porte de armas e a reforma da Previdência.

 

Assim, a possibilidade de retirar do regimento interno da Casa as ferramentas de obstrução é vista como um aceno dos pré-candidatos à base bolsonarista. Nesta última quarta-feira (28), durante “cursinho” para os novos deputados, Maia criticou o regimento atual da Casa. “Já deveríamos ter feito uma revisão [do regimento]. Ele foi criado para um sistema do início da redemocratização, quando nos tínhamos basicamente dois partidos”, disse.

 

“Hoje tem 20, 25, 23, dependendo do bloco.” Campos elencou para seus correligionários a “atualização” do regimento como uma de suas propostas. “Atualizar e adequar o Regimento Interno à nova realidade de representação partidária na Casa para garantir efetividade ao processo legislativo”, escreveu o candidato em nota para oficializar sua pré-candidatura enviada ao grupo de WhatsApp da bancada do PRB.

 

“Temos que fazer ajustes no regimento para dar efetividade ao processo legislativo, senão vamos demorar dez horas só para votar uma medida provisória”, afirmou à reportagem. “Agora, para saber exatamente os pontos [a serem mexidos] eu quero sentar com a consultoria da Casa”, disse. Questionado pela reportagem na quinta-feira (29) sobre quais seriam os trechos a serem mudados, o presidente da Câmara não respondeu.

 

No entanto, em seu discurso Maia citou um ponto que, segundo técnicos da Câmara é consensual na base do futuro governo: o fim do tempo determinado de sessão. Hoje, após cinco horas é encerrada a sessão deliberativa da Casa, o que protela as votações. Isso porque, após a abertura de uma nova reunião, é possível primeiro que parlamentares da oposição peçam nova contagem de quorum e apresentem novos requerimentos para adiamento ou retirada de pauta sobre a matéria em discussão.

 

Além disso, os líderes ganham direito à fala novamente. Num cenário de pulverização, em que partidos muitas vezes possuem apenas um deputado na Casa, essa parte pode tomar metade do tempo da nova sessão. No próximo ano, porém, a disputa pelos microfones da Casa deve ser acentuada.

 

O regimento, que está em vigor desde 1989 e já sofreu emendas desde então, pode ser alterado por meio de um projeto de resolução aprovado em plenário em dois turnos. Para Mozart Vianna, que trabalhou no Legislativo por 40 anos, 24 deles como secretário-geral da Mesa, uma mudança do regimento pode ser positiva para impedir “excessos” de obstrução.

 

“Mas há o direito da minoria, para que a maioria não possa passar por cima”, diz ele, que critica, no entanto, a possibilidade de se apresentar seguidos requerimentos de adiamento de sessão. “Às vezes entram em obstrução em uma matéria que não é polêmica para que a pauta não chegue na polêmica, e aí não se vota nada”, afirmou.

 

A oposição, porém, já critica a possibilidade de retirada de ferramentas de obstrução do regimento. Segundo o líder do PSOL, Ivan Valente (SP), a mudança regimental atende um desejo imediatista da base de Bolsonaro.