Daniela Leone

Um capítulo inédito foi escrito na história do Vitória. Pela primeira vez em 120 anos, uma médica trabalhou em um jogo do time profissional rubro-negro. O ineditismo fez Nathália Figueirêdo roubar a cena no banco de reservas do Barradão na sexta-feira (19) passada, durante o triunfo por 2×0 contra o Criciúma, pela décima rodada da Série B do Campeonato Brasileiro.

No clube há cinco anos, a médica não esconde a satisfação por ter conquistado o espaço à beira das quatro linhas. “A sensação foi de realização, de quebra de paradigma, porque existe uma resistência mundial ao trabalho feminino no futebol. Existia muito mais e vem sendo quebrada”, pontua.

“O Nordeste tem uma tendência ainda maior em ser machista, mas não gosto de me vitimizar. Com trabalho e seriedade você acaba vencendo. Por mais que tenha resistência, na persistência você vai mostrando que o trabalho sempre vence”, acredita.

Graduada em 2007 pela Escola Bahiana de Medicina, Nathália fez especialização em medicina esportiva na Universidade de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, e em nutrição aplicada ao exercício físico pela Universidade de São Paulo. Aos 36 anos, ela tem um currículo recheado de experiências com o esporte. Entre elas, foi gerente médica nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio-2016.

O jogo contra o Criciúma não foi o primeiro do Vitória em que Nathália atuou. “Nunca parei para contar, mas com certeza já trabalhei em mais de 200”, afirma. Todos os anteriores foram servindo às divisões de base ou ao time de aspirantes. De janeiro de 2014, quando chegou à Toca do Leão, a maio deste ano, Nathália trabalhou no departamento médico da base rubro-negra.

Depois que o atual presidente Paulo Carneiro assumiu, em abril, ele unificou os departamentos para cortar custos. O Vitória é o segundo clube de futebol no currículo de Nathália. Durante o período de residência no Rio Grande do Sul, ela integrou o departamento profissional do Internacional, mas nunca atuou em jogos.

Na última sexta-feira, a médica viveu uma experiência única não apenas profissionalmente. Baiana de Xique-Xique, ela é a filha mais velha de seu Marivaldo, quem a ensinou a torcer pelo Vitória desde criança. Os irmãos Fernando César e César Augusto nunca foram tão ligados a futebol como ela.

Pertinho da torcida, no banco de reservas, Nathália extravasou quando Anselmo Ramon marcou o segundo gol contra o Criciúma e acabou com o jejum de três meses sem vitórias. “Eu tenho fama de pé-quente desde a base. Os maiores títulos que a base teve eu estava presente”, conta, em meio a risos. Ela estava presente quando o Vitória foi campeão da Copa do Brasil sub-17, em 2015.

Adoentado, seu Marivaldo não a viu fazer história no Barradão, mas tem um orgulho danado do caminho que a filha trilhou e guarda até hoje, plastificado, o primeiro cartão de visitas dela como médica do clube.

‘Sentimento de inclusão’
O torcedor do Vitória vai se acostumar a ver Nathália em campo atendendo os jogadores. Em definitivo na escala de médicos para jogos do time profissional, ela vai viajar com a delegação para os jogos contra Figueirense e Brasil de Pelotas, na 13ª e 14ª rodadas da Série B, respectivamente.

“O sentimento é de inclusão. Estou feliz e realizada por fazer parte da escala, porque é uma questão de inclusão real no time profissional, de fazer parte de verdade do grupo principal”, comemora a doutora rubro-negra. Correio da Bahia