Viajar para a caatinga do sertão da Bahia exige preparo e desapego, mas conhecer o bioma semiárido mais biodiverso do mundo tem as suas compensações: araras-azuis-de-lear voando soltas pela natureza, paisagens inóspitas com paredões e cânions, cactos de todos os tipos e formas, além da história envolvendo a região de Canudos são alguns exemplos.

A viagem para a região pode despertar a atenção para os 182 animais da caatinga que estão ameaçados de extinção. As ameaças à conservação das espécies e o desafio de preservá-las são foco do especial “Desafio Natureza”, que já abordou a ‘redescoberta’ da arara-de-lear na região e as ações de preservação da onça-pintada e parda.

5 coisas que você precisa saber antes de ir:

  • O calor gira em torno dos 40°C. Piscinas são um sacrilégio para uma região que pode ter como sinônimo a palavra ‘seca’. Prepare-se para suar e hidrate-se
  • Protetor solar não é suficiente para preservar sua pele. Use roupas específicas para a exposição ao sol (como as de pescadores ou surfistas) e evite cores muito chamativas quando for avistar as aves
  • A revoada das aves ocorre ao amanhecer. Prepare-se para acordar às 4h
  • Os deslocamentos precisam ser feitos em carros com tração 4×4 – e tudo é bem longe
  • Não há resorts ou hotéis luxuosos; as acomodações, em geral, são simples

Raso da Catarina: revoada em Canudos

Toca Velha, dormitório das araras-de-lear, em Canudos — Foto: Marcelo Brandt/G1
Toca Velha, dormitório das araras-de-lear, em Canudos — Foto: Marcelo Brandt/G1

A cidade de Canudos (BA), que ficou famosa pelo messianismo de Antônio Conselheiro e a guerra travada entre 1896 e 1897 que matou 25 mil pessoas, é também um dos principais destinos para quem gosta de observar os pássaros em seus habitats naturais.

A beleza da região é tamanha que Antonio Conselheiro chamava-a de Belo Monte, referindo-se às montanhas do entorno.

A 20 km de Canudos, a Fundação Biodiversitas mantém uma área de 1.500 hectares onde está um dos principais dormitórios da arara-azul-de-lear, a Toca Velha. Fica na Estação Biológica de Canudos. A visita precisa ser agendada com a fundação.

De avião, é possível chegar em Canudos pelos aeroportos de Petrolina (178 km), Paulo Afonso (208 km), e Salvador (395 km).

A hospedagem pode ser na cidade de Canudos ou em alojamentos dentro da área da fundação, que oferece 6 quartos para até 12 pessoas.

Casal de arara-de-lear sobrevoa a área da Toca Velha, em Canudos. Local é mantido pela Fundação Biodiversitas. — Foto: Marcelo Brandt/G1
Casal de arara-de-lear sobrevoa a área da Toca Velha, em Canudos. Local é mantido pela Fundação Biodiversitas. — Foto: Marcelo Brandt/G1

Há dois tipos de roteiros para os visitantes:

  • Revoada das araras-de-lear: saída do alojamento às 4h, de carro 4×4, em direção aos paredões de arenito, acompanhados dos guarda-parques. A visão das araras é feita por cima dos paredões. Depois, os guarda-parques levam os visitantes para fazer uma trilha pela reserva para observação de outras aves da caatinga.
  • Alimentação das araras-de-lear: o passeio até as áreas da região onde ficam os licurizeiros, palmeiras que produzem os alimentos preferidos das araras. No caminho, o visitante passará pela vegetação da Caatinga e comunidades tradicionais.

Os custos são de R$ 150 por pessoa, para visitar o parque, e R$ 150 por pessoa/dia, se for ficar hospedado dentro da Estação Biológica de Canudos.

Parque Estadual de Canudos

Panorâmica no Parque Estadual de Canudos: represa cobriu a antiga cidade, que já havia sido alvo de incêndio durante a Guerra de Canudos. Parque abriga memória histórica e cultural. — Foto: Marcelo Brandt/G1
Panorâmica no Parque Estadual de Canudos: represa cobriu a antiga cidade, que já havia sido alvo de incêndio durante a Guerra de Canudos. Parque abriga memória histórica e cultural. — Foto: Marcelo Brandt/G1

O parque foi feito sobre a área onde teve a batalha histórica entre o exército brasileiro e os seguidores de Antonio Conselheiro. Foi feito para preservar a história e a memória de quem lutou na guerra. A taxa de visitação é de R$ 20.

Trata-se de um sítio histórico e arqueológico, com vegetação nativa e sem construções históricas — a antiga cidade de Canudos foi queimada pelo exército, e a que se reconstruiu das ruínas foi inundada por uma represa. O parque fica a 13 km da atual Canudos.

Exposição a céu aberto dentro do Parque Estadual de Canudos com retratos dos descendentes dos conselheiristas. — Foto: Marcelo Brandt/G1
Exposição a céu aberto dentro do Parque Estadual de Canudos com retratos dos descendentes dos conselheiristas. — Foto: Marcelo Brandt/G1
Os pontos de visitação foram marcados com base em ilustrações da época feitas para jornais que reportavam a batalha — um dos correspondentes foi o autor Euclides da Cunha, que depois escreveu o livro ‘Os Sertões’. Algumas trincheiras usadas no combate ainda estão lá.
Uma Palmatória (Tacinga palmadora), espécie de cacto típica da caatinga, é vista no Parque Estadual de Canudos, no norte da Bahia — Foto: Marcelo Brandt/G1
Uma Palmatória (Tacinga palmadora), espécie de cacto típica da caatinga, é vista no Parque Estadual de Canudos, no norte da Bahia — Foto: Marcelo Brandt/G1

A indicação de Luiz Paulo Neiva, diretor do Campus Avançado de Canudos da Universidade Estadual da Bahia (Uneb) é começar a visita pelo Alto da Favela (onde estão as árvores que deram origem ao nome dos morros), seguir pelo Vale da Morte (onde os militares eram sepultados), o Vale da Degola (onde jagunços tiveram pescoços cortados), o Alto do Maio ou Mário (onde morreu o coronel Antônio Moreira César em 1897, comandante da terceira expedição) e está a ruína de uma casa da Fazenda Velha.

Retratos com descendentes dos conselheiristas estão expostos por todo o parque, para preservar a memória.

Revoada das araras-de-lear e cânion seco

Cânion seco da Baixa do Chico, local que tem atraído araras-de-lear desde 2014. — Foto: Marcelo Brandt / G1
Cânion seco da Baixa do Chico, local que tem atraído araras-de-lear desde 2014. — Foto: Marcelo Brandt / G1

O cânion seco da Baixa do Chico impressiona pelo tamanho das formações rochosas de arenito e pela extensão: são 12 km de vale, onde é possível fazer trilha e se sentir pequenininho frente à exuberância da natureza. Desde 2014, a área vem sendo repovoada pelas araras-azuis-de-lear.

A cidade mais próxima é Paulo Afonso (BA), que tem aeroporto que recebe vôos duas vezes por semana. A cidade é estruturada, com hotéis bem avaliados e opções de pousadas.

Cactos do tipo facheiro (Pilosocereus pachycladus), são vistos durante amanhecer na Baixa do Chico, no norte da Bahia — Foto: Marcelo Brandt/G1
Cactos do tipo facheiro (Pilosocereus pachycladus), são vistos durante amanhecer na Baixa do Chico, no norte da Bahia — Foto: Marcelo Brandt/G1

A entrada do cânion seco está a cerca de 40 km do centro da cidade, e fica dentro na Reserva Ecológica do Raso da Catarina.

Os índios pankararés habitam a entrada do cânion e cobram uma taxa de visitação de R$ 20. Os passeios precisam ser feitos com guias turísticos e marcados com antecedência.

A lua cheia é vista durante amanhecer na Baixa do Chico, região de caatinga no norte da Bahia — Foto: Marcelo Brandt/G1
A lua cheia é vista durante amanhecer na Baixa do Chico, região de caatinga no norte da Bahia — Foto: Marcelo Brandt/G1

Para chegar lá, é preciso passar por comunidades rurais e pegar estrada de chão com veículo 4×4. A revoada das araras-de-lear acontece nas primeiras horas do amanhecer. Durante a trilha, é possível vê-las saindo das tocas de dentro dos paredões.

Boqueirão da Onça: cavernas e pinturas rupestres

Vista em estrada no Parque Nacional do Boqueirão da Onça, no norte da Bahia — Foto: Marcelo Brandt/G1
Vista em estrada no Parque Nacional do Boqueirão da Onça, no norte da Bahia — Foto: Marcelo Brandt/G1

O Parque Nacional do Boqueirão da Onça ainda não está aberto para visitação, mas há passeios que podem ser feitos na região. Ao lado de guias, é possível conhecer cavernas, pinturas rupestres e vivenciar a própria caatinga.

Agências de turismo de Petrolina (PE), onde está o aeroporto mais próximo, e de cidades da região, como Campo Formoso e Sento Sé, na Bahia, organizam os passeios ou podem indicar guias autônomos. Mas, fique atento: como o turismo na região ainda não está totalmente formalizado, encontrar as informações pode exigir um pouco mais de preparação.

G1 entrevistou os espeleólogos André Araújo, presidente da Sociedade Espeleológica Azimute, e Thiago Mattos Espírito Santo, que também é guia autônomo, para saber quais os principais destinos da região.

Segundo Santo, os roteiros são para quem está “disposto a conhecer algo bem diferente e sair da zona do conforto.” Confira:

  • Toca da Barriguda: a caverna que tem 30 km de extensão pode ser percorrida em 1h30. É uma caverna labiríntica, com galerias subterrâneas que se interligam. Dentro dela, há estalactites e estalagmites, formações rochosas sedimentares formadas a partir da ação do tempo e da água no teto e no chão de cavernas. É preciso usar equipamentos de proteção, como capacetes e lanternas.
  • Toca da Boa Vista: considerada a maior do Brasil e do hemisfério sul, com 106 km de galerias subterrâneas já fotografadas e catalogadas. O local, no entanto, está aberto apenas para pesquisas. O solo está coberto por uma fina camada de poeira, que fica em suspensão quando os visitantes passam por lá, causando mal-estar para quem não está acostumado.
  • Gruta do Sumidouro e cachoeira do rio Salitre: a gruta é mais espaçosa para o turista e não exige o uso de capacete e lanterna. Dentro dela passa o rio, e é possível tomar um banho para se refrescar durante o passeio. A 30 km dali fica a cachoeira do rio Salitre, com queda de 3 metros e poço de 3,5 metros de profundidade. É um “oásis” no sertão, porque está em meio à paisagem semiárida da caatinga.
  • Pinturas rupestres: elas estão em cavernas no entorno da comunidade de Queixo Dantas. São grandes e representam cenas cotidianas. Ainda não foram datadas.
Informações do G1