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Diz a crença popular que “a justiça tarda, mas não falha”. Que ela é falha, pode-se até questionar, mas que ela tarda, isso não há dúvidas. O próprio renomado jurista baiano Ruy Barbosa disse que “Justiça tardia nada mais é do que injustiça institucionalizada”. Na Bahia, para se obter a sentença de um juiz em um processo de 1º grau, a demora é, em média, de 5 anos e 5 meses, segundo dados de 2019 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O estado ocupa a sexta posição entre os tribunais com maior tempo de espera para a emissão de sentença do Brasil, empatado com o de Santa Catarina.

Os maiores índices estão em São Paulo, onde a média de sentença é de 8 anos e 4 meses, seguido do Paraná (7 anos e 2 meses), Pernambuco e Paraíba (7 anos e 1 mês),  Espírito Santo (6 anos e 7 meses) e Amazonas (5 anos e 11 meses). A justiça mais célere do país é a do Rio Grande do Sul, onde – pasmem – a sentença é proferida em cerca de 2 meses. O segundo lugar é do Rio de Janeiro e do nosso quase vizinho Alagoas (1 ano e 3 meses), seguido de Sergipe (1 ano e 4 meses).

Os números se referem aos processos na justiça comum, isto é, de ações de maior complexidade, e não inclui os da área criminal. Às vezes, podem durar bem mais que isso, como foi o caso do pai do advogado Iago Moreira. Ele entrou com uma ação em 2012 por conta de uma acidente de trânsito, que durou até 2019. “Em 2015, o processo foi digitalizado estando ausente a carta precatória. Depois de quatro anos parado, em novembro de 2019, depois de uma visita ao cartório para explicar a situação, o processo foi julgado procedente”, explicou Moreira.

O secretário de Planejamento do Tribunal de Justiça da Bahia, Pedro Vivas, defende que não existe um único motivo para explicar a litigiosidade da Justiça baiana, uma vez que são muitos os atores envolvidos. “Não podemos fugir da liturgia legal, porque o poder judiciário é difuso e existem vários fatores de retenção, tem a defensoria pública, a OAB, o Ministério Público, as partes – que às vezes fazem a litigância de má fé, ocupando o tempo do juiz”, afirma o secretário.

Vivas também pontua que o TJ-BA foi o primeiro tribunal das Américas, fundado em 1609. Ou seja, processos se acumulam há muito mais tempo que o de Sergipe, que surgiu em 1892, ou o do Rio Grande do Sul, fundado em 1874. Além disso, o índice de produtividade do TJ-BA, tanto dos magistrados quanto dos servidores, ocupou o terceiro lugar no ranking nacional no ano passado, mesmo com a redução do pessoal. Desde 2014, o número de magistrados caiu 11% e o de servidores 17%. No entanto, o número de processos baixados, em média, por cada juiz no estado chegou a 3.096 em 2019, 31% a mais em relação a 2018.

Outro argumento levantado foi que o tempo do giro de acervo – período que dos novos casos demoram para serem analisados – é de 2 anos, abaixo da média nacional e o quarto melhor resultado do país. “O crescimento da justiça brasileira é o maior do mundo e as demandas são exponenciais, aumentam a cada ano, na medida em que a sociedade toma conhecimento de seus direitos e começa a brigar. Mesmo com o melhor índice de produtividade dos magistrados, não é suficiente para dar conta”, justifica o secretário.

Ainda segundo o CNJ, a quantidade de processos que a justiça baiana recebeu foi de 1.412.185, número 10% maior que no ano anterior “Mesmo com tamanha carga de processos a cada ano, os magistrados têm atuado fortemente para reduzir o estoque, com a média de processos julgados e baixados por juiz acima da média de novas ações”, afirmou a presidente da Associação de Magistrados da Bahia (AMAB), Nartir Weber.

Os cidadãos que quiserem dar sugestões para a otimização processual e para o planejamento estratágico do TJ-BA dos próximos 6 anos podem contribuir na consulta pública que está aberta neste link até amanhã (15/09). Não é preciso se identificar para contribuir com a consulta.

Processos nos juizados são mais rápidos

O cenário da Bahia é bem melhor nos processos julgados pelos juizados especiais, onde o tempo reduz para 5 meses – o mais rápido do Brasil, ao lado do Distrito Federal. Só que nem todos os casos podem ser julgados por eles, como explica o advogado e procurador Roberto Figueiredo, presidente da Associação de Procuradores da Bahia. “Nos juizados, são julgadas causas de menor complexidade e a lei autoriza o uso da oralidade, a informalidade, a simplicidade e a celeridade. Além disso, o sistema de juizado prevê o uso de juízes leigos, que potencializam essa produtividade”, esclarece o procurador.

Figueiredo acrescenta ainda que, nos juizados, não é necessário fazer um relatório na sentença, que é uma das três etapas do processo de julgamento. As ações nos juizados são aquelas de até 40 ou 60 salários mínimos, como multas de trânsito, direito do consumidor, reintegração de posse, etc. Já na justiça comum estão as mais complexas, que normalmente precisam de uma auditoria ou perícia.

Caso mais antigo na justiça brasileira é resolvido em setembro de 2020

O caso mais antigo da justiça brasileira foi resolvido na primeira semana de setembro de 2020. O processo foi feito pela princesa Isabel, em 1895. Ela entrou com uma ação contra o estado pela posse do Palácio da Guanabara, que é hoje sede do governo do Rio de Janeiro, onde mora o afastado governador Wilson Witzel. A princesa e seu marido, o Conde d’Eu, alegavam terem sido expulsos pelos militares que deram fim à monarquia, iniciando o período republicano no país. Este mês, o STF decidiu que o palácio pertencia ao estado, portanto, nenhuma herança ficou para os descendentes da família real brasileira.

Direito do consumidor lidera ranking do TJ-BA

Nos últimos cinco anos, o assunto que mais tem enviado novos processos à Justiça na Bahia é o de direito do consumidor. O no número de ações subiu de 395.848, em 2015, para 807.754, em 2019. O aumento é de 104%. Entre os assuntos relacionados, o de danos morais está no primeiro lugar. É o item que mais gerou processos em 2019, segundo o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). Completam o ranking do último ano indenizações por danos materiais e inclusão indevida em cadastro de inadimplência. Os mesmos assuntos compõem, até o momento, o ranking de 2020.

RANKINS NACIONAL DO TEMPO DOS PROCESSOS NA JUSTIÇA COMUM / JUIZADOS ESPECIAIS 
São Paulo – 8 anos e 4 meses/ 2 anos e 3 meses
Paraná- 7 anos e 2 meses/ 1 ano e 4 meses
Pernambuco – 7 anos e 1 mês/ 1 ano e 5 meses
Paraíba – 7 anos e 1 mês/ 10 meses
Espírito Santo – 6 anos e 7 meses/ 1 ano e 10 meses
Amazonas – 5 anos e 11 meses/1 ano e 3 meses
Santa Catarina – 5 anos e 5 meses/ 10 meses
Bahia- 5 anos e 5 meses/ 5 meses
Piauí – 5 anos e 3 meses/ 1 ano e 10 meses
Minas Gerais – 5 anos e 2 meses/ 1 ano e 3 meses
Ceará – 5 anos/ 2 anos e 3 meses
Pará- 5 anos/ 1 ano e 10 meses
Goiás- 4 anos e 9 meses/ 11 meses
Mato Grosso do Sul- 4 anos e 8 meses/ 10 meses
Mato Grosso- 4 anos e 7 meses/10 meses
Maranhão- 4 anos e 4 meses/ 9 meses
Rio Grande do Norte- 4 anos e 3 meses/ 1 ano e 9 meses
Rondônia- 4 anos e 3 meses/ 1 ano e 1 mês
Roraima- 3 anos e 6 meses/ 1 ano e 4 meses
Tocantins- 2 anos e 6 meses/ 6 meses
Acre- 2 anos e 1 mês/8 meses
Distrito Federal- 2 anos/ 5 meses
Amapá- 1 ano e 11 meses/ 9 meses
Sergipe- 1 ano e 4 meses/ 6 meses
Alagoas- 1 ano e 3 meses/ 1 ano e 3 meses
Rio de Janeiro- 1 ano e 3 meses/ 1 ano e 3 meses
Rio Grande do Sul- 2 meses/ 9 meses
Fonte: Correio da Bahia/CNJ