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Relatório de entidades ligadas à ONU publicado nesta segunda-feira (29) alerta que o uso excessivo de medicamentos pode levar a 10 milhões de mortes por ano até 2050. As entidades apontam problemas ligados aos remédios antimicrobianos, entre os quais estão antibióticos, antivirais, antifúngicos e antiprotozoários.

O uso excessivo deles em humanos, em animais e em plantas está fazendo com que as doenças que seriam por eles tratadas fiquem mais resistentes e causem mais danos. Mas como essa resistência ocorre, em primeiro lugar?

A cada vez que uma pessoa toma um antibiótico, por exemplo, as bactérias podem desenvolver formas de resistência a sua fórmula. Quanto mais a pessoa toma antibióticos, maiores as chances de a resistência se desenvolver e levar a uma versão mais grave da doença, às vezes não tratável.

As infecções resistentes a remédios já causam, pelo menos, 700 mil mortes todo ano, de acordo com o relatório desta segunda (29). Dessas, 230 mil são por causa da tuberculose multirresistente.

No Brasil, entre 40 e 60% das doenças infecciosas já são resistentes a medicamentos, afirmam os especialistas Matthew Stone, da Organização Mundial para Saúde Animal (OIE), e Maria Helena Smedeo, da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

No ano passado, a OMS já havia alertado para um aumento no número de casos, no mundo, de tuberculoses resistentes a medicamentos. Membros da OMS também participaram da elaboração do novo documento, feito em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e a Organização Mundial para Saúde Animal (OIE), além de diversas outras entidades.

Segundo um relatório do Banco Mundial publicado em 2016, o prejuízo econômico nos sistemas de saúde causado pela resistência dos micróbios a medicamentos pode ser comparável ao da crise financeira de 2008, com impactos globais de até um 1 trilhão de dólares (cerca de R$ 3,9 trilhões) até 2050.

Ao mesmo tempo, o mundo poderia perder até 3,8% do seu PIB até 2050 se não forem adotadas medidas para prevenir as doenças resistentes a medicamentos.

Prejuízos na exportação de carne

Entre 2000 e 2010, o consumo dos antimicrobianos aumentou 36% em 71 países. O Brasil, a Rússia, a Índia, a África do Sul e a China responderam por 75% desse crescimento, afirmam Matthew Stone e Maria Helena Smedeo, citando um estudo publicado há dois anos na revista “The Lancet”.

De acordo com os especialistas, caso nada seja feito para impedir a proliferação de doenças resistentes a medicamentos, o agronegócio brasileiro também pode ficar ameaçado. Em 2018, o Brasil lucrou 6,57 bilhões de dólares (cerca de R$ 25,8 bilhões), 7,9% a mais do que no ano anterior, com a exportação de carne bovina. O país é o maior exportador do mundo.

“Mas o crescimento desse mercado não é garantido. Ao redor do mundo, a saúde do gado está sendo ameaçada com a resistência antimicrobiana, um processo no qual uma doença não pode ser mais tratada por remédios existentes. Essa crise coloca em risco a saúde de humanos, animais e plantas”, alertam.
Para eles, há um uso indevido de antibióticos hoje, em esforços preventivos, mas em última instância contraproducentes, de proteger os animais de ficarem doentes.

Por outro lado, dizem, “o Brasil deu um passo importante em 2016 ao banir o uso de colistina, um dos antibióticos mais importantes, para consumo animal. Ainda assim, o meio mais eficiente de reduzir a necessidade de medicamentos é parar a proliferação de infecções entre os animais”, explicam os especialistas. “Isso pode ser feito com melhor higienização em fazendas e com a expansão de vacinação para vacas e outros animais.”

Os especialistas destacam que, no ano passado, o país lançou um plano para combater e controlar a resistência aos antimicrobianos,envolvendo vários setores do governo, que deve ser implementado até 2022.

Como resolver?

O relatório desta segunda (29) também apresenta cinco recomendações para abordar o uso de antibióticos e combater o desenvolvimento de doenças resistentes a eles:

  1. Acelerar o progresso em países, inclusive para assegurar o acesso a vacinas. Os governos devem parar de usar os antimicrobianos para promover crescimento do gado, conforme orientações da OIE, FAO e OMS;
  2. Inovar para garantir o futuro, envolvendo doadores, públicos e privados, para aumentar a inovação em vacinas, diagnósticos e alternativas ao uso de microbianos, seja na saúde humana, animal ou vegetal, assim como em alternativas de descarte de lixo e saneamento básico.
  3. Colaborar para uma ação mais efetiva, com o envolvimento da sociedade civil e do setor privado para lidar com a resistência aos antimicrobianos;
  4. Investir para uma resposta sustentável, com o aumento de financiamento de iniciativas que lidem com a resistência antimicrobiana. Elas devem ter maior prioridade, também, nos orçamentos domésticos dos países;
  5. Reforçar a governança global e a responsabilidade internacional. O Secretário-Geral da ONU, com a colaboração de outras agências como FAO, OIE, e OMS, deve fornecer relatórios sobre a resistência antimicrobiana a países, recomendando medidas para adaptação e mitigação dos efeitos. Também recomenda a criação de um grupo global em saúde sobre resistência antimicrobiana. Informações do G1