Foto: Divulgação/João Wendel

A Bahia é vice-líder na produção de energia eólica do Brasil, ficando atrás apenas do Rio Grande do Norte. Com isso, o estado tem sido um grande reforço na geração da eletricidade, em tempo de escassez hídrica, nos últimos dez anos. Por causa da grande faixa litorânea e da área tropical, o Nordeste é a região brasileira que tem mais potencial de geração dessa atividade e detém a maioria dos parques eólicos do país. Esses parques são espaços terrestres onde ficam os aerogeradores, que transformam o vento em eletricidade. Para entender como funciona a produção, estocagem, distribuição e geração da energia eólica, o G1 conversou com a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), Elbia Gannoum.

Primeiro, como o vento vira energia?

“O vento é transformado em energia quando ele encontra um motor mecânico, chamado turbina. Então nós temos as turbinas eólicas, que têm um motor e que têm três pás, o aerogerador. O vento encontra as três pás, gera uma força neste motor mecânico, que é transformada em energia elétrica”.

Por que a energia eólica é considerada limpa?

“Quando o vento toca o aerogerador, toca as pás e o motor mecânico transforma isso em energia elétrica, não há emissão de CO2 [dióxido de carbono], por isso ela é considerada limpa. Ao gerar energia, não se queima o combustível, só se utiliza o vento, que é limpo. Então, ela é limpa e é renovável”.

E por que é renovável?

“Porque é uma energia que vem do vento e o vento é infinito, ele se renova a cada instante. Então além de ser limpa, ela é renovável e tem essa característica infinita”.

E quando não tem vento?

“O vento é infinito, porém é variável. Então, nós temos períodos em que venta mais e períodos em que venta menos. O período em que venta mais é o que nós chamamos de safra dos ventos. No sentido figurativo, a gente fala que está colhendo mais vento, que é o período da segunda metade de junho a meados de novembro. Só que de novembro a maio, que é o período com menos colheita de vento, a gente ainda tem vento gerando energia. O vento não para nunca, ele varia, com período maior e período menor, mas a gente está sempre gerando energia”.

E… dá para estocar vento?

“É possível estocar vento, sim [risos]. Essa brincadeira de não poder estocar vento é mentira”.

Então, como o vento é estocado?

“Por meio dos reservatórios. Hoje a gente também tem a tecnologia de baterias de armazenamento. Tecnicamente, a gente já tem as baterias, que vamos instalar a partir de 2025. Mas como nós estocamos o vento hoje? Por exemplo em São Francisco e Sobradinho, nesse momento de escassez hídrica, o operador desliga a máquina ou ele liga a máquina gerando só um pouco de energia elétrica e deixa só o vento gerar”.

De que forma a Bahia contribui na geração de energia eólica?

“A Bahia está gerando energia, junto com a região Nordeste, para ajudar o Brasil a sair dessa escassez hídrica que estamos vivendo. Estamos vivendo a maior crise hídrica da história, por conta das questões climáticas. A Bahia contribui e muito para a segurança energética do Brasil, e para o abastecimento do país com fonte limpa, renovável e competitiva. Nós estamos evitando o acionamento de mais usinas térmicas e, portanto, de emissão de CO2 de custo ao consumidor final”.

Em números, quanto produzimos?

“Hoje, dos 19 gigawatts [unidade de potência da energia] que estão instalados e operando no Brasil, 17.5 estão no Nordeste brasileiro. O Rio Grande do Norte está com cerca de 5.9 gigawatts de capacidade instalada, e a Bahia com 5.4. E quando nós colocamos os parques [eólicos] em construção e os parques em geração, os dois estados estão muito próximos em termo de produção de energia eólica”.

Há uma escala de geração de crescimento?

“A Bahia é o segundo estado do país com a maior capacidade instalada de eólica, o segundo estado com a maior geração de eólica e também de projetos em construção. Nós temos um potencial enorme no estado. Nós temos um grande potencial, tanto próximo ao litoral, quanto no interior. Um aspecto muito relevante da eólica é o desenvolvimento social e econômico que essa fonte pode trazer”.

Qual cidade baiana produz mais energia eólica?

“Nós olhamos para a Bahia e pensamos na geração do estado como um todo, mas nós temos projetos por basicamente todo o interior. Xique-Xique, Gentio do Ouro, Sento Sé, são regiões que produzem energia eólica, mas nós estamos com muitos projetos pulverizados, porque a produção de eólica é muito grande, muito forte”.

Quanto da energia elétrica que usamos hoje vem dos ventos?

“A energia eólica se tornou a segunda fonte em geração de energia no Brasil, respondendo nesse momento até por 20% da geração. Nesse momento de escassez hídrica, se nós não tivéssemos os parques eólicos, nós já estaríamos em racionamento de energia, como vivemos em 2001, 2002. Na média anual, a gente produz cerca de 10% da energia de todo o Brasil, sendo que no segundo semestre a gente chega a produzir 20%”.

Se enfrentamos escassez hídrica e o vento é infinito, dá para substituir a geração das hidrelétricas por energia eólica?

“Quando nós olhamos para a matriz elétrica, é muito importante entender que ela precisa ser a mais diversificada possível. Então, nós não podemos cometer o mesmo erro do passado, lá em 2001, quando o Brasil teve uma crise hídrica severa e racionamento de energia. A eólica vai se tornar mais significativa ainda na matriz, e a hidrelétrica vai reduzir o seu papel. Mas, o ideal de uma matriz, é uma boa distribuição entre os recursos. É importante ter uma boa quantidade de hídrica, de eólica, de solar e de outras fontes. É uma matriz diversificada que traz segurança para o país”.

A energia produzida na Bahia é usada em outros lugares do Brasil?

“Toda e qualquer energia produzida é colocada na rede e é distribuída para o país como um todo. A energia que é produzida na Bahia, é consumida em São Paulo, por exemplo. Como nós estamos com escassez hídrica, as hidrelétricas estão produzindo menos e nós estamos no pico de geração eólica. Então, embora a energia esteja sendo produzida na Bahia, ela beneficia a todos os brasileiros, e todo o sistema se beneficia dessa energia”.

Dá para gerar e usar energia eólica em casa ou em pequenas empresas?

“É, tecnicamente possível, o que nós chamamos de microgeração eólica. Nós temos, inclusive, algumas fábricas brasileiras que fazem os mini-aerogeradores. Então, dependendo das condições da residência, das condições de vento, é possível também produzir mini e microgeração eólica”.

A produção de energia eólica gera empregos?

“Esse é o aspecto que nós consideramos fundamental da energia eólica, porque temos um efeito multiplicador da economia muito relevante. Há geração de emprego de toda a cadeia produtiva, porque o Brasil produz o aerogerador. Essa turbina é 80% produzida no Brasil e isso traz emprego ao longo de toda a produção da energia”.

Os parques eólicos também geram renda?

Os parques [eólicos] empregam a população local. Esse é um fator relevante do efeito multiplicador econômico. O segundo fator é que, quando nós fazemos e construímos os parques, nós alugamos as terras. Ao alugar as terras, nós trazemos um arrendamento para as famílias. Então, nós temos famílias no interior, no semiárido, que a partir da chegada dos parques eólicos passaram a receber, por mês, uma renda que é de cerca de R$ 1 mil, R$ 2 mil, por cada aerogerador, por 20 anos. Esse processo traz um efeito social muito grande”.

Qual o impacto disso no Índice de Desenvolvimento Humano?

“Nós fizemos um estudo na região Nordeste e identificamos que, as regiões que receberam os parques eólicos, tiveram um aumento do IDH da ordem de 20% e um aumento do PIB [Produto Interno Bruto] da ordem de 21%, só pela chegada dos parques eólicos”.

E qual o papel da ABEEólica nisso tudo?

“A ABEEólica reúne toda a cadeia produtiva dos investidores em eólica, sejam os fabricantes de turbina, fabricantes de parafuso, de pás, as empresas de engenharia fornecedoras de serviço, os investidores em parques. A ABEEólica existe há 20 anos e o nosso papel principal é trabalhar em prol da fonte eólica, para o crescimento e desenvolvimento dessa fonte, e levar para a sociedade a importância da geração eólica como uma fonte limpa, renovável, que contribui para o planeta, porque nós não emitimos CO2 e trazemos desenvolvimento econômico e social”. G1