Gene Kelly deve estar se remoendo no túmulo. Não foram raras as referências ao clássico “Cantando na chuva” após o lançamento do filme, de 1952. Duvido, porém, que alguma tenha sido tão constrangedora quanto a aparição do ministro da Educação, Abraham Weintraub, para falar sobre o que ele chamou de “fake news” sobre a liberação de recursos para a reforma do Museu Nacional, destruído por um incêndio em setembro de 2018.

Com guarda-chuva girando nas mãos, o ministro surgiu para reclamar de uma fictícia chuva de notícias falsas. Um vídeo tão vergonhoso quanto as declarações dele sobre ideologia de esquerda na educação. É inegável, todavia, que o objetivo foi alcançado. Weintraub “lacrou”.

Engraçado que esse termo é extremamente criticado pela direita, pois há a reclamação constante de que a esquerda “lacrativa” dominou o país e ocupa a imprensa “golpista” contra a salvação do país, simbolizada pelo ministro. Começo a desenvolver uma teoria interessante: o titular da Educação não tem amigos.

Se tivesse, alguém falaria a ele que um vídeo como aquele não contribui em nada para o cargo, muito menos para o debate sobre a pasta que ele comanda. Enquanto Weintraub “lacra” nas redes sociais, o barco da educação segue em ritmo de naufrágio… De um lado, “haviam” excessos por parte de um ministro – sim, o verbo está conjugado da mesma maneira com que Weintraub utiliza, então perdoem-me por repetir.

Do outro, milhares de pessoas iam para as ruas de diversas partes do Brasil em um protesto contra o corte de recursos para pesquisas e o contingenciamento das verbas para as universidades e institutos federais. Na concepção original, o movimento tenderia a ser como no dia 15 de maio, uma “festa da democracia”.

No entanto, foi mais partidarizado que a edição anterior e vai contribuir expressivamente para descredibilizar um pouco a pauta. Parabéns aos envolvidos. Não que não tenham havido estudantes na manifestação.

Até tinham. Porém o anúncio de que os sindicatos planejam uma greve geral no próximo dia 14 foi o atestado de que, para além de uma mobilização em defesa da educação, movimentos ligados a partidos políticos se “apossaram” do ato para criticar o governo federal. Estão errados? Não faço juízo de valor nesse sentido. Apenas constato que uma das principais críticas da trupe de Jair Bolsonaro vai se encaixar e isso deve afetar o alcance da discussão.

Acho bacana que tenhamos vividos dois extremos relacionados à educação em um mesmo dia. Por mais que discorde da incorporação de pautas como “Lula livre” ou “Fora Bolsonaro” da mobilização “popular”, ainda prefiro apoiar o movimento nas ruas. Porque, sinceramente, não dá para defender o que o ministro fez com o clássico de Gene Kelly. Por Fernando Duarte