Deputados de siglas de esquerda, como PDT e PC do B, contribuíram para aprovação na Câmara da PEC que pode privatizar áreas da União no litoral brasileiro. A votação ocorreu em fevereiro de 2022. À época, Daniel Almeida (PCdoB-BA) afirmou que era preciso “criar algum mecanismo de reconhecimento, de regularização e inclusive de proteção dessas áreas, das pessoas, das atividades que estão sendo exercidas ali.”
“Muitas das vezes, pessoas que são vulneráveis e vivem em habitações populares, não tendo alternativa, tiveram que se fixar ali. Por essa razão, a matéria se justifica”, afirmou naquela ocasião, segundo a coluna Painel, da Folha de S. Paulo.
Em nota divulgada nesta terça-feira (4), a bancada do PCdoB na Câmara negou apoiar a PEC com a redação atual. Segundo a sigla, quando o projeto tramitou na Casa, “em nenhum momento foi tratado de privatização de praias ou alteração da legislação ambiental”.
“O PCdoB posicionou-se nos destaques e votou para mitigar o esbulho e a especulação que já hoje existe nessas áreas e contra que essas transferências beneficiassem concessionárias (para que esses terrenos ficassem vinculados aos serviços relacionados a essas concessões e não às empresas concessionárias). Os destaques foram, no entanto, derrotados”, diz o texto (leia a íntegra mais abaixo).
No caso do PDT, o argumento usado foi a cobrança do laudêmio, taxa de 5% paga à União sobre a transferências de domínio e que foi vedada na PEC aprovada na Câmara.
“O brasileiro que mora nas proximidades da costa litorânea já pagou mais do que podia, mais do que devia”, criticou o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS).
A matéria precisava de ao menos 308 votos em dois turnos para ser aprovada —o placar foi de 377 a favor e 93 contrários no primeiro e 389 a favor e 91 contrários no segundo.
Na votação em primeiro turno, PT e governo Bolsonaro tiveram alinhamento raro ao orientar o voto contrário, assim como PSOL, PSB e Rede. Todos os demais partidos, incluindo PC do B e PDT, foram favoráveis à proposta que transfere terrenos de marinha em áreas urbanas da União para estados e municípios ou para proprietários privados.
No caso do PC do B, dos sete deputados que votaram, só uma, a ex-deputada Perpétua Almeida (AC), foi contra nos dois turnos. No PDT, dos 22 só dois foram contrários ao texto também nos dois turnos.
O PSOL e a Rede foram os dois únicos partidos em que todos os parlamentares votaram contra o texto. No PT, a maioria foi contrária —houve uma abstenção e quatro votos favoráveis no primeiro turno e três votos favoráveis no segundo.
Atualmente, o projeto tramita no Senado envolto em polêmicas nas redes com críticas a eventual privatização do acesso às faixas de areia.
Leia a íntegra da nota do PCdoB:
“A bancada do PCdoB na Câmara dos Deputados, de larga tradição de coerência e vinculação às lutas populares, vem, em relação ao seu voto quando da apreciação da PEC 39, no ano de 2022, esclarecer que:
1- Durante a sua tramitação na Câmara dos Deputados, a PEC 39 mereceu nosso voto favorável, ressalvados os destaques, porque o texto viabilizava a regularização de habitações de interesse social para foreiros e ocupantes cadastrados, realizando a regularização fundiária, respeitando o definido no Estatuto das Cidades e nos seus planos diretores.
2- Podemos citar, por exemplo, as populações de Brasília Teimosa no Recife, da Gamboa em Salvador, vastas áreas em São Luís e os pescadores de Santa Catarina. Este era o contexto.
EM NENHUM MOMENTO FOI TRATADO DE PRIVATIZAÇÃO DE PRAIAS OU ALTERAÇÃO DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL.
EM NENHUM MOMENTO A ÊNFASE ERA PARA FAVORECER A ESPECULAÇÃO IMOBILIÁRIA QUE, COM CORAGEM, CONTESTAMOS.
3- O PCdoB posicionou-se nos destaques e votou para mitigar o esbulho e a especulação que já hoje existe nessas áreas e contra que essas transferências beneficiassem concessionárias (para que esses terrenos ficassem vinculados aos serviços relacionados a essas concessões e não às empresas concessionárias). Os destaques foram, no entanto, derrotados.
4- Nesses anos de bolsonarismo, os ataques sobre direitos sociais, ambientais e às cidades foram aprofundados. Confundir a luta por regularização fundiária com o apoio à especulação imobiliária e à privatização de praias é reduzir a importância da conquista dos direitos das populações impactadas por uma legislação ultrapassada. Devemos estar atentos a mudanças que possam ser feitas no texto no Senado.
5- Por isso, a bancada do PCdoB se soma à justa mobilização social, nas ruas e nas redes, contra qualquer ameaça ao espaço público das praias, ao meio ambiente e contra a usura da especulação imobiliária.
Brasília, 4 de junho de 2024
Bancada do PCdoB na Câmara dos Deputados.”