O advogado Francisco Victor Bouissou é um empregado público da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), mas desde janeiro havia sido apresentado publicamente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) como diretor de Gestão e Planejamento da autarquia.

Apesar de estar atuando de fato no cargo, ele só foi nomeado oficialmente no “Diário Oficial da União” nesta quinta-feira (4), três dias após o G1 questionar a situação dele no instituto. Entre a apresentação pública pelo Inep e a nomeação oficial para o cargo se passaram 70 dias.

Mas fontes ouvidas pelo G1 dizem que Bouissou já havia começado a frequentar a sede do instituto em Brasília ainda no fim de dezembro, durante o processo de transição das gestões. O G1 perguntou ao Inep na tarde desta sexta-feira (5) se a situação do diretor estava irregular, mas não havia recebido resposta até a publicação da reportagem.

Reportagem no site do Inep em 24 de janeiro, no dia da posse do então presidente Marcus Vinicius Rodrigues, apresentou publicamente 'a nova gestão' — Foto: Igor Estrella/G1
Três dias após questionamento do G1, o Inep publicou, no 'Diário Oficial da União', a portaria na qual Francisco Victor Boiussou é oficialmente cedido pela Infraero ao cargo de diretor de Gestão e Planejamento do Inep — Foto: Igor Estrella/G1

E-mail corporativo e nome no site

Na segunda-feira (1º), o G1 ligou para o gabinete da Diretoria de Gestão e Planejamento (DGP) do Inep e perguntou qual era o e-mail do diretor. A resposta foi um endereço oficial utilizado por servidores do instituto, com o complemento “@inep.gov.br”.

Na página “Estrutura Organizacional” no site oficial do Inep, Bouissou também constava como diretor de Gestão e Planejamento em 1º de abril. Pelo menos até 5 de fevereiro, a página ainda não tinha nenhum nome definido para o cargo de diretor, que estava oficialmente vago desde 14 de janeiro.

A nomeação dele, porém, não havia aparecido no “Diário Oficial da União” até então. O G1 também enviou um e-mail à assessoria de imprensa do Inep no mesmo dia, perguntando se ele já havia sido nomeado de fato.

O Inep não respondeu ao e-mail. Mas, na edição de quinta (4) do DOU, uma portaria assinada na quarta (3) determinou oficialmente a cessão de Bouissou da Infraero para o cargo de diretor de Gestão e Planejamento do Inep.

Segundo a portaria, quem paga o salário dele continua sendo a Infraero. Dados do Portal da Transparência da estatal mostram que ele foi admitido em 7 de julho de 2014 para o cargo de “analista superior II – advogado especialista”. De acordo com o portal, em março a função dele era de procurador III na Gerência de Ações Regulatórias e Societárias da Infraero, com carga horária de 40 horas semanais e remuneração bruta de pouco menos de R$ 10 mil.

Posse só acontece após nomeação

A atuação de um servidor em um cargo sem a nomeação fere a lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que determina as regras do regime jurídico dos servidores públicos civis da União. Em dois trechos, a lei diz que “a investidura em cargo público ocorrerá com a posse”, e que a posse deve acontecer “no prazo de trinta dias contados da publicação do ato de provimento”.

No DOU, nenhum ato administrativo foi assinado por Bouissou, e especialistas em direito consultados pelo G1 afirmaram que a situação, embora irregular e um indicativo de má-gestão, não incorre em penas além de algum tipo de advertência.

Segundo eles, a falha ocorreu em uma das etapas do processo burocrático de nomeação e também em áreas administrativas do Inep, que permitiram o acesso do funcionário da Infraero e anteciparam atividades que deveriam aguardar a nomeação e a posse, como a criação de um e-mail corporativo ou o acesso aos sistemas internos.

O maior problema de uma pessoa atuar em um cargo sem ter sido nomeada oficialmente, de acordo com eles, é o acesso a informações sensíveis. No caso da Diretoria de Gestão e Planejamento do Inep, o diretor tem acesso a documentos como contratos, pagamentos, fornecedores, licitações em fase de planejamento, além de cronogramas detalhados de todas as provas, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), incluindo as rotas por onde os malotes com provas passarão, e o endereço em que elas ficarão armazenadas. G1