O delegado Giniton Lages reconheceu, em depoimento à Justiça, que a investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes apresentou falhas que adiaram a identificação dos acusados do crime, de acordo com a Folha. Os erros foram na coleta e análise de imagens para identificar o trajeto feito pelo carro usado pelos assassinos.

Isso impediu até mesmo que a investigação da polícia para saber se o veículo saiu ou não do condomínio Vivendas da Barra, onde à época morava o policial militar aposentado Ronnie Lessa, acusado de ser o executor do crime, e também o presidente Jair Bolsonaro, que só se mudou para o Palácio da Alvorada após a posse.

Responsável pela apuração do caso até março deste ano, o delegado Giniton Lages declarou ao juiz Gustavo Kalil, em 2 de agosto, na ação penal contra Lessa e Queiroz. O depoimento estava sob segredo judicial até a semana passada.

O erro, segundo Lages, ocorreu dias após o crime, quando agentes foram à Barra da Tijuca, a fim de coletar imagens de segurança de prédios do bairro. A polícia já sabia o trajeto de parte do percurso feito pelo carro e o delegado escalou uma equipe para coletar as imagens para tentar flagrar nelas a passagem do veículo antes do ponto já conhecido. O grupo recolheu arquivos do Itanhangá até a região do chamado “quebra-mar” (início da orla da Barra), no entanto, não localizou o carro.

“[A rota que os criminosos percorreram antes do Itanhangá] Era uma incógnita até setembro, outubro de 2018. Até que entra uma informação que resolvia a equação. O carro saiu do quebra-mar”, afirmou o delegado no depoimento.

Sete meses depois do crime, os policiais voltaram a analisar as imagens recolhidas e notaram que usaram um programa incompatível com o arquivo e reduziu a resolução do vídeo. Por meio da ferramenta correta, foi possível identificar a passagem do Cobalt utilizado no crime.

“A equipe cometeu o maior pecado de uma investigação, que foi chegar até o quebra-mar e não seguir para trás. Acreditou demais em sua própria ‘expertise’. Quando levaram a imagem para análise, tinham que ter a certeza que o carro não passou. Eles não perceberam um defeito de Codec [programas utilizados para codificar e decodificar arquivos de mídia] naquela imagem”, declarou o delegado.

“Com a segurança que nenhum policial pode ter numa atividade como essa, eles olharam as imagens, [mas] não são especialistas. Tinham que pedir a um especialista para olhar com outros olhos. [O especialista] Teria visto o carro em março [de 2018]. E aí toda a energia iria para a praia. E muito provavelmente pegaríamos eles entrando no carro, o carro parado há mais tempo. Teríamos outras informações que não temos hoje”, disse ele.

O delegado comentou também as críticas a eventuais erros na investigação. “É fácil falar. Difícil é fazer. Se arvorar de falar o que nunca viveu é mole. É o efeito CSI. O cara assiste uma série de TV americana e acha que a vida real é a mesma coisa”, justificou.