Apesar do crescimento da campanha digital, a campanha de 2022 foi mais do que nunca uma disputa por eleitores nas ruas. Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) extraído na sexta-feira (18) mostram que os candidatos gastaram este ano R$ 748 milhões com “atividades de militância e mobilização de rua”.

O valor supera em cerca de 89% o registrado em 2018, já com a correção da inflação. Há quatro anos essa despesa foi a quinta maior das campanhas, este ano perdeu apenas para a “publicidade por materiais impressos”, que teve a maior soma: R$ 1,2 bilhão. Todos os valores ainda podem passar por atualizações no TSE.

O gasto com a militância em 2022 superou, inclusive, as despesas com “produção de rádio, televisão ou vídeo”, que somaram R$ 453 milhões, quinto maior desembolso das campanhas. Entre os cargos em disputa, a maior proporção de gasto com militância foi para o de deputado distrital. Cerca de 23,8% de tudo que os candidatos à Assembleia Legislativa do DF gastaram foi com a mobilização de rua. Este foi a maior despesa dos candidatos a deputado distrital este ano.

Os candidatos a deputado estadual são aqueles com o segundo gasto proporcional com a mobilização de rua (15,2%), seguidos dos candidatos a deputado federal (13,71%). A menor proporção de gastos com militância foi para a disputa presidencial. Entre todas as despesas dos candidatos, menos de 1% foi dedicado a atividade de rua.

Para o estrategista Diego Cunha, que trabalhou em 74 campanhas em nove estados este ano, o aumento das despesas com militância e mobilização ocorreu em razão dos cenários da disputa em 2022. Ele cita, como exemplo, o grande destaque das campanhas majoritárias e a busca por trabalho temporário.

“O primeiro (cenário) é justamente o destaque que as campanhas majoritárias tiveram, obrigando as campanhas proporcionais investirem mais recursos para conseguir se destacar nas cidades, principalmente as maiores. Outro ponto é o econômico, com um aumento no número de pessoas procurando trabalho temporário, que é o principal durante as eleições. Particularmente pude ver um aumento significativo das pessoas procurando esse tipo de trabalho, logo, as campanhas vão absorvendo essa demanda”, afirma Cunha, que já trabalhou em 700 campanhas nos últimos 14 anos.

O estrategista considera ainda que a profissionalização das campanhas afetou os valores dos gastos com mobilização de rua:

“Tem também o fator profissionalização das campanhas eleitorais e a modernização das normas, o que faz com que as campanhas contratem mais, registrem mais essas contratações e tudo isso dentro de um cenário cada vez mais competitivo, ou seja, hoje se registra mais do que antes”, observa.

Presidenciáveis apostaram no digital

A segunda novidade dessa disputa foi o aumento da participação dos gastos com o impulsionamento de conteúdo digital. Em 2018, os candidatos investiram cerca de R$ 78 milhões, décima maior despesa da campanha. Este ano, o valor chegou a R$ 364 milhões, sétimo lugar no ranking dos gastos. Os desembolsos com a campanha digital, contudo, foram maiores quando considerados também os gastos com a criação de sites (R$ 33 milhões) ou mesmo a produção de vídeos direcionados para as redes.

Entre os cargos em disputa, aqueles que concorriam à Presidência foram os que mais investiram proporcionalmente no impulsionamento de conteúdo. No total, foram R$ 67 milhões, o que representou 19,4% das despesas dos candidatos, segunda maior, perdendo apenas para a “produção de programas de rádio, televisão ou vídeo”, que somaram 24,8% dos gastos (R$ 86 milhões).

Professor e pesquisador em Comunicação Política da PUC-RJ, Arthur Ituassu acredita que a aposta no digital tenderá a crescer nos próximos anos. Para ele, que também integra Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital, o valor descrito nos gastos de campanha de 2022 estão, na verdade, subestimados:

“Essa é uma novidade da campanha e isso só vai aumentar. E tem uma coisa interessante. A despesa com o digital fica subestimada porque toda a parte de produção de vídeo, que aparece em outra rubrica da prestação de contas, inclui também a produção de vídeo para ser veiculada no Youtube. No nosso grupo de pesquisa, observamos um gasto com o impulsionamento no Youtube muito relevante”.

A aposta no impulsionamento digital se refletiu nas despesas dos dois candidatos a presidente que foram para o segundo turno. Segundo os dados do TSE atualizados até 18/11, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) gastou R$ 25 milhões com impulsionamento, cerca de 19,2% das suas despesas, enquanto Jair Bolsonaro (PL) desembolsou R$ 33 milhões (35%) para ampliar a visibilidade do conteúdo digital da sua campanha. O candidato do PT investiu mais na produção de programas de rádio, TV ou vídeo: cerca de R$ 37,8 milhões (28,9%), enquanto Bolsonaro R$ 10,8 milhões (11,6% das suas despesas).

“Essas despesas com o digital podem ser compreendidas da seguinte forma. Você tem um candidato forjado nas mídias sociais, no caso Jair Bolsonaro, e isso fez o outro competidor (Lula) apostar também na arena digital. Em 2018 isso não aconteceu. Bolsonaro nadou de braçada. Este ano, por outro lado, já houve uma disputa no digital que também envolveu a Simone Tabet, o Ciro Gomes e o PT, que também procurou olhar mais para essa arena. Outro ponto que destacaria foi o aumento exponencial de fake news no fim da campanha, e que explica de certo modo a atuação do André Janones (deputado federal eleito por Minas). Ele conseguiu entrar nessa disputa”, acrescenta Ituassu. G1