Foto: Jorge Júnior/Rede Amazônica

Preocupado com o impacto que uma alta nos preços de combustíveis pode ter sobre a popularidade do seu governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenta encontrar uma saída alternativa a volta dos impostos sobre gasolina e etanol, que estava prevista para quarta-feira (01/03).

O corte total de PIS/Cofins havia sido adotado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) para baratear combustíveis no ano passado, medida que críticos avaliaram como eleitoreira.

O ministro da Fazenda do atual governo, Fernando Haddad, defendia um retorno imediato desses impostos no primeiro dia da gestão Lula, devido à necessidade de reforçar o caixa da União para cobrir a ampliação dos gastos sociais e reduzir o rombo nas contas públicas, projetado para fechar o ano em mais de R$ 200 bilhões.

No entanto, a pressão da ala política do governo já havia levado à prorrogação da desoneração do diesel e do gás de cozinha até o final do ano e da gasolina e do etanol até fevereiro.

Agora, diante de uma novo embate entre os dois lados, o presidente deve optar por um caminho intermediário.

Segundo a assessoria do Ministério da Fazenda confirmou à BBC News Brasil, a volta dos impostos será feita de forma diferenciada sobre etanol e gasolina, com uma cobrança maior sobre este último, por ser um combustível mais poluente.

O ministério ainda não definiu quais alíquotas serão cobradas, mas assessoria da pasta diz que novo modelo vai garantir a arrecadação de R$ 28,8 bilhões que estava prevista para este ano com volta integral dos impostos sobre os dois combustíveis a partir de março.

A assessoria disse ainda que está em estudo uma reformulação na forma como os impostos são cobrados ao longo da cadeia de combustíveis para reduzir o impacto da reoneração no bolso do consumidor.

O objetivo é que a mudança esteja alinhada com “três princípios de sustentabilidade: ambiental (onerando mais o combustível fóssil), social (penalizando menos o consumidor) e econômica (preservando a arrecadação)”.

No entanto, não houve ainda anúncio oficial e as reuniões internas no governo sobre o tema continuam.

O receio da ala política com a volta dos impostos é que isso provocará o encarecimento dos combustíveis, podendo afetar a popularidade do governo já no seu início.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, usou o Twitter na sexta-feira para defender a prorrogação do corte de impostos, até que o novo Conselho de Administração da Petrobras, que assume em abril, possa discutir uma nova política de preços de combustíveis.

Essa política hoje segue a oscilação do petróleo no mercado internacional, o que tem resultado em preços mais altos.

O novo presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, e Hoffmann defendem que os preços sigam os custos de produção nacional, em vez da cotação internacional, enquanto críticos dessa opção dizem que isso traria prejuízos à estatal, afetando sua capacidade de investimentos.

“Não somos contra taxar combustíveis, mas fazer isso agora é penalizar o consumidor, gerar mais inflação e descumprir compromisso de campanha”, argumentou Hoffmann.

Como os combustíveis impactam a popularidade?

 

Os itens mais sensíveis para a vida da população e que, portanto, podem afetar mais a popularidade do governo são diesel e gás de cozinha – não à toa, estão com desoneração prorrogada até o fim do ano.

O encarecimento do gás de cozinha, essencial para alimentação, tem impacto direto para a população mais pobre.

Já o diesel abastece os caminhões que rodam o país transportando os mais diversos produtos, inclusive alimentos. Por isso, uma subida de preço tende a impactar também o custo de outros produtos, que ficariam mais caros para o consumidor final.

Além disso, o governo monitora o risco de protestos de caminhoneiros que poderiam ocorrer com o aumento do preço do diesel.

Em 2018, durante o governo de Michel Temer, um movimento desse tipo paralisou muitas rodovias no país, provocando retração econômica.

No caso da gasolina, críticos dessa desoneração argumentam que o preço desse combustível não afeta tanto a população mais pobre, que em geral não utiliza automóvel próprio.

Por outro lado, o item impacta trabalhadores de baixa renda, como entregadores e motoristas de aplicativo, além de pesar sobre a classe média e setores mais ricos.

Como nota o cientista político da consultoria Tendências, Rafael Cortez, são segmentos que historicamente têm mais capacidade de pressionar o governo e que têm sido mais críticos ao PT.

Pesquisas de intenção e voto durante a eleição mostravam que Bolsonaro apoio superior a Lula entre todos os segmentos com renda familiar acima de dois salários mínimos, enquanto o petista vencia entre os mais pobres.

Ele lembra ainda que o debate sobre o encarecimento dos combustíveis ocorrem em um momento em que a sociedade como um todo já acumulou um desgaste com a inflação mais alta nos últimos anos.

“Isso afetou não só as classes de renda mais baixa, mas também essa classe média baixa que de alguma maneira emergiu, entrou no mercado de consumo, mas também sofreu bastante por conta dos últimos anos com a inflação andando muito, muito alta”, afirma.

“E como o Bolsonaro soube muito bem dar vazão a esse grupo, a expressar demandas dessa natureza, a complexidade política se tornou ainda maior na hora do governo tomar essas decisões (de rever a desoneração)”, analisa ainda.

Para Cortez, também está no radar do governo a possibilidade de uma eventual perda de popularidade abrir espaço para o fortalecimento do bolsonarismo, inclusive de alas mais extremistas que atuaram na invasão das sedes dos Três Poderes em Brasília, no dia 8 de janeiro.

O próprio ministro da Justiça e da Segurança Pública, Flávio Dino, manifestou essa preocupação em entrevista recente ao jornal O Estado de S. Paulo.

“A pergunta é: o governo Lula vai melhorar a vida do povo brasileiro? Se a resposta for sim, o golpismo tende a ser uma força declinante. Se o governo enfrentar dificuldades no resultado, aí abre espaço para a emergência do golpismo”, argumentou Dino. G1