Dois anos após a prisão de Sérgio Cabral (MDB), as investigações sobre o caso avançam para os “tentáculos” do esquema atribuído ao ex-governador. Alvo de 26 ações penais, oito condenações que somam 183 anos de prisão, Cabral é suspeito de manter uma rede de mesadas que reúne mais de 60 pessoas, que vão desde o governador Luiz Fernando Pezão (MDB) a um fundador de um bloco carnavalesco.

 

Os beneficiários também foram parentes, funcionários de baixo escalão e secretários. Os valores variam de R$ 150 mil a R$ 500 mensais. Somados, perfazem um gasto de quase R$ 4 milhões só em mesadas. A maior parte dessa rede foi revelada pelo economista Carlos Miranda, que firmou acordo de colaboração premiada com a Procuradoria-Geral da República.

 

Ele sairia na sexta (16) da prisão, como parte do acordo, o que não ocorreu até a conclusão desta edição por problemas burocráticos. Cabral, que foi detido em 17 de novembro de 2016, é acusado de pedir 5% de propina nos maiores contratos do estado em sua gestão (2007-2014). As denúncias já apontam o pagamento de R$ 418 milhões em propina. Há outras frentes de investigação que devem ampliar este valor segundo o Folhapress.

 

“Sabemos que não foi só o que narramos nas denúncias. Adotamos uma postura conservadora, de apontar o que realmente tem elementos concretos para embasar”, afirmou o procurador Leonardo Freitas, membro da força-tarefa. Miranda auxiliou na identificação das fontes de propina. Mas a principal contribuição deste ex-colega de escola de Cabral se dá nos demais beneficiários do esquema.

 

Na semana passada, sete deputados foram presos na Operação Furna da Onça, se somando a outros três que já haviam sido alvo há um ano. Eles são acusados de receber mensalmente valores entre R$ 100 mil e R$ 20 mil. Além deles, o ex-procurador-geral de Justiça Cláudio Lopes também foi para a cadeia acusado de receber mesada de R$ 150 mil do ex-governador para protegê-lo no Ministério Público estadual.

 

“Várias instituições foram alcançadas por esses tentáculos da organização. Não seria de se estranhar que outras também tenham sido afetadas, na pessoa de um infiltrado”, disse o procurador Freitas. Um dos principais desafios do atual estágio é obter provas que corroborem o relato de Miranda. Minutos antes de ser preso, ele jogou num lago de sua fazenda o computador em que controlava toda essa rede de pagamento.

 

O Ministério Público estadual encontrou com a ajuda de mergulhadores a máquina. Mas os arquivos ainda não foram recuperados –mesmo com a ajuda do FBI. Outras investigações acabaram por ratificar boa parte do relato de Miranda, cuja delação tem mais de 80 anexos.

 

Cabral desde o início nega ter pedido propina a empreiteiros. Reconhece ter arrecadado caixa dois de campanha eleitoral e que usou para fins pessoais sobra desse dinheiro. Se há um ano sua negativa era altiva, com um tom de confronto que quase o levou para um presídio federal, o ex-governador agora assume erros, com autocrítica mais aguçada. “Foi nessa promiscuidade [com empresários] que eu me perdi, que eu usei dinheiro de campanha para fins pessoais.

 

[…] Eu não soube me conter diante de tanto poder e tanta força política”, disse Cabral em junho em interrogatório ao juiz Marcelo Bretas. Ele afirmou ter arrecadado cerca de R$ 500 milhões em caixa dois, dos quais R$ 20 milhões custearam despesas pessoais. Para o Ministério Público Federal, os valores são maiores e a proporção embolsada por Cabral, ainda mais.

 

“A extensão desses valores em nada justifica com gastos de campanha. O período desses maus feitos transcendeu em muito o período eleitoral”, diz Freitas. A fim de garantir redução de penas, o ex-governador e a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo abriram mão de seus bens para leilão.

 

A venda dos bens gerou, no total, R$ 12 milhões além de outros quase R$ 14 milhões bloqueados em bancos -resta ainda uma lancha a ser vendida. Pezão afirmou, por meio de sua assessoria, que “repudia com veemência essas mentiras”. A defesa de Lopes afirmou que “tomará as medidas cabíveis”.