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No São João, a população de Mucugê costuma dobrar com os cerca de 10 mil visitantes que chegam na cidade. Os 1,8 mil leitos de 28 pousadas formais ficam completamente lotados, sem contar as cerca de 200 casas alugadas e as pessoas que se hospedam nas cidades vizinhas. Mas nesse ano, o que a cidade quer mesmo é que não apareça um pé de gente de fora.

E Mucugê não está sozinha nessa. O Correio encontrou, pelo menos, outras quatro cidades que não querem que o pessoal vá para lá no São João: Santo Antonio de Jesus, Amargosa, Cruz das Almas e Senhor do Bonfim, todas com tradição fortíssima nos festejos juninos.

“Alô, turistas e visitantes! Mucugê te ama, mas espera por você num outro momento”. É assim que começa um comunicado emitido pela prefeitura da cidade nas redes sociais. Só no ano passado, a festa popular movimentou cerca de 5 milhões na economia da cidade para um investimento de R$ 500 mil da prefeitura.

“Não é um São João de atrações caras e sim tradicional. Por isso, o investimento não é tão alto. Isso começou a chamar a atenção de muitas pessoas que movimentam a economia, desde o posto de gasolina até o bar da esquina. O turismo já representava 10% do PIB da nossa cidade”, explicou o secretário de administração e finanças Euvaldo Ribeiro Junior.

Nesse ano, Mucugê investiu em campanhas educativas e preventivas, e fechou todo o setor de hospedagem, proibiu que se acendam fogueiras e soltem fogos e instalou uma barreira sanitária na entrada da cidade, para monitorar quem chega. “Tudo isso, desestimula o turismo mas não proíbe que as pessoas que tenham casas na cidade venham, por exemplo. O que podemos fazer é fiscalizar para que esses visitantes, se vierem, fiquem em quarentena”, disse o secretário. Segundo o último boletim epidemiológico do município, Mucugê possui cinco casos de coronavírus, todos já curados, e nenhuma morte.

Santo Antônio de Jesus
Com pouco mais de 100 mil habitantes – o que a consolida como uma das maiores cidades do interior do estado -, Santo Antônio de Jesus (SAJ), a 190 quilômetros de Salvador, também tem investido em uma comunicação que desestimule o turismo na cidade no período junino deste ano.

“O período é junino, mas a farra na roça terá que ser adiada. Em tempos de pandemia, visitar a zona rural coloca em risco a vida dos moradores e facilita a proliferação do vírus. Fique em casa! Seja responsável!”, diz um comunicado postado nas redes sociais do município. O outro é um recado direto à população: “Agora não é o momento de receber visitas e se aglomerar. Os seus visitantes podem estar contaminados sem saber e contaminar a sua família. Proteja-se!”

Em Santo Antônio de Jesus, o São João também é muito importante. O município se tornou famoso pelas atrações de música pop, que comandam a festa e que atraiam turistas de toda Bahia. Nesse período, porém, a pandemia vivida é tão preocupante que o amor à vida deve falar mais alto. No último boletim do município, divulgado no último domingo (21) já eram 262 casos e 5 mortes.

“Para a cidade, o prejuízo é incalculável. É imenso. O São João mexe demais com a economia local. O comércio chega a declarar que as vendas no período junino são mais fortes do que no Natal, por exemplo. Bares, restaurante e casas de shows não podem abrir agora. Temos um comitê que fiscaliza isso e todos estão cumprindo”, disse a secretária de cultura, Denilce Côrtes.

Em 2020, a prefeitura pretendia investir R$ 4 milhões na realização de 250 horas de shows de mais de 120 atrações musicais. Jorge e Mateus, Tayrone e Tierry era alguns dos nomes pensados para a festa, mas nenhum contrato chegou a ser efetivado, segundo Denilce.

Turistas 
Se os municípios pedem para que os turistas não os visitem esse ano, o jeito é obedecer – por mais difícil que seja. O publicitário Gabriel Falcão, 40 anos, está sofrendo. Desde os 17, ele viaja para o interior nesse período, alternando Santo Antônio de Jesus com Amargosa, Senhor do Bonfim e Cruz das Almas. Ele é tão apaixonado pelo São João que criou um site só para falar sobre o assunto, o São João na Bahia.

“Os festejos juninos no interior são diferentes dos da capital. Você não precisa de carro para nada, pois é tudo perto. O comportamento das pessoas é diferente. O clima da cidade é diferente. A experiência gastronômica é diferente. E quanto mais a cidade se afasta de Salvador, mais tradição junina ela tem”, lembra, Gabriel.

Mas esse ano, vai ser difícil ver essa tradição acontecer em qualquer lugar. “O arrasta-pé vai ser aqui em casa mesmo, cumprindo o isolamento social. Vou me dedicar a produzir conteúdo para o meu site”, disse. Se não fosse a pandemia, Amargosa era o destino certo do publicitário, mas o prefeito Júlio Pinheiro já afirmou que não quer turistas. Lá, foram registrados 24 casos confirmados e uma morte.

“Alerte a sua família e parentes que não venha nesse período de São João. Esse é um momento de preservar o nosso povo, mas também preservar as pessoas que possam estar vindo para Amargosa”, disse o prefeito à população. Localizada no Vale do Jiquiriçá, a pouco mais de 240 km de Salvador, a cidade reforçou as medidas de combate à covid-19 no período junino.

“Eu já decretei suspensão de qualquer evento ou atividade de caráter cultural, religioso e político que promova algomeração. No São João, isso será mantido com uma fiscalização mais rigorosa da prefeitura”, disse Júlio Pinheiro. Entre as ações especiais, o aumento no termo de permanência de agentes nas barreiras sanitárias e a proibição de fogueiras ou qualquer tipo de aglomeração.

Em Senhor do Bonfim, outro destino tradicional na época do São João, no Norte do estado, a prefeitura decidiu fiscalizar na rua carros com placas que não sejam da cidade. E também emitiu comunicados pedindo que nativos não retornem para visitas, nem para passar as festas juninas com familiares. “Não venham, porque não vai ter festa, precisamos nos proteger e proteger nossas famílias”, declarou o prefeito Carlos Brasileiro. A cidade já tem 92 casos de coronavírus e uma morte.

Em Cruz das Almas, essa fiscalização também está acontecendo e dando o que falar. No último sábado (20), um carro com três pessoas saiu de Salvador e foi impedido de entrar na cidade, pois nenhum passageiro comprovou residência no município. De acordo com a prefeitura, os cidadãos ainda tentaram entrar a pé, mas foram novamente abordados pela Polícia Militar e levados para a delegacia local. A cidade já possui 71 casos confirmados e uma morte.

Fogueira 
Todas as cidades citadas estão desestimulando as fogueiras não só pela possibilidade de aglomeração que existe, associada à tradição, mas pelo perigo que a inalação da fumaça causa no organismo. “O cheiro da combustão dos fogos de artifício e a fumaça causam irritação nas vias aéreas, podendo desencadear mecanismos biológicos que facilitam a entrada do covid-19 no organismo ou agravar o quadro de pacientes que já estejam infectados”, explicou Patrícia Bagano, médica clínica da S.O.S. Vida.

Ela ainda destaca o perigo da sobrecarga no sistema de saúde por causa disso. “Nesse período do ano, as emergências costumam receber muitos pacientes com sintomas respiratórios. Se os pronto atendimentos estiverem lotados devido aos casos da covid-19, como ficará a assistência dos outros pacientes com sintomas respiratórios?”, indagou. A solução, então, é só fazer fogueira ou soltar fogos quanto tudo isso passar.  Informações do Correio da Bahia