O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nesta sexta-feira (31) que a extrema direita “capturou” as redes sociais com a finalidade de “atacar a democracia”. Moraes deu a declaração ao comentar os ataques golpistas, promovidos por bolsonaristas radicais, às sedes dos Três Poderes em Brasília no dia 8 de janeiro.

O magistrado participou nesta sexta de um seminário com o tema “O STF e a defesa da democracia”, promovido pela Fundação Fernando Henrique Cardoso. Na avaliação de Moraes, o uso das redes sociais por extremistas de direita ocorreu não só no Brasil, mas em vários países do mundo.

“Não foi uma questão brasileira só. Tivemos, no mundo todo, uma captura pela extrema direita das redes sociais com uma clara finalidade: o ataque à democracia, a quebra das regras democráticas”, disse o ministro.

Para Moraes, a extrema direita diagnosticou a possibilidade de uso das redes sociais a partir dos atos da primavera árabe. A partir daí, com “competência”, passou a dominar o ambiente virtual para atacar a democracia. Uma das estratégias utilizadas para tentar fragilizar a democracia, na avaliação do ministro, foi a de desacreditar a imprensa.

“A extrema direita domina as redes. É impressionante a incapacidade do restante da sociedade em pelo menos equilibrar. Mas como se iniciou isso? Desacreditando a imprensa. ‘Vamos atacar e desacreditar a imprensa’. A ideia foi: ‘vamos equiparar nossa noticia, a noticia fraudulenta, mentirosa, conhecida como fake news, vamos equiparar desinformação com informação'”, declarou.

Segundo o ministro, além da ofensiva contra a imprensa, extremistas passaram a atacar o sistema eleitoral e o Poder Judiciário, pilares da democracia.

Ataques a ministros

Em relação aos ministros do STF, Moraes disse que a extrema direita passou a divulgar na internet informações sobre a rotina dos magistrados, com estímulos a ataques. “Nas redes sociais, havia endereço dos ministros, roteiro, horários, incentivando [a pessoa] a fingir que ia pedir autógrafo pra esfaquear em aeroporto. Tudo isso por rede social, em grupos. Tinha a planta do STF pra colocar bomba ali, bomba aqui. Ou seja, para amedrontar”, contou Moraes.

O magistrado disse que essa “campanha de terrorismo” poderia resultar no surgimento de “lobos solitários”. “Alguém que está nessa bolha acorda um dia e fala: ‘O STF precisa acabar, eu vou matar um ministro’. E todos que entendem de segurança sabem que o mais difícil de evitar é o lobo solitário”, declarou.

Responsabilização das redes sociais

Em outro momento do discurso, Moraes defendeu a responsabilização das redes sociais que veiculam conteúdos de ódio publicados por usuários. Na avaliação dele, discursos com esse teor levam a atos como os de 8 de janeiro. “Todos devem ser responsabilizados, todos, e nós temos que ver mecanismos pra evitar que isso ocorra novamente. Inclusive, métodos de responsabilização das redes sociais. Elas foram instrumentalizadas e se permitiram instrumentalizar”, afirmou.

Moraes, que também é presidente do Tribunal Superior Eleitoral, tem feito uma série de reuniões com empresas que gerenciam redes sociais para discutir medidas de combate a fake news. O ministro afirmou também que houve uma tentativa por parte de extremistas de “aniquilar” o Supremo Tribunal Federal.

“No momento em que o STF abaixasse a cabeça, como o STF poderia exigir que o juiz de 1ª instância enfrentasse os políticos locais? Se a cúpula do poder Judiciário não enfrenta, você não pode exigir q um juiz enfrente. E a queda do STF seria a queda do poder judiciário brasileiro e a queda do estado democrático de direito”, afirmou.

Outras declarações

No seminário, Moraes também disse que:

  • Houve, por parte da campanha de Jair Bolsonaro, tentativas de descredibilizar a Justiça Eleitoral:

“[Houve] a grande e patética manobra do PL, depois das eleições, pedindo, numa terça-feira, a anulação. […] O que importa não é só o pedido, era a narrativa, a expectativa de que, ao instruir, ganhariam tempo para aumentar isso. E o que houve, imediatamente, isso não levou nem meia hora, o aditamento. Por que a urna do primeiro turno, que é igual à do segundo turno, é boa? ‘Porque eu ganhei’. E a segunda é ruim? ‘Porque eu perdi’. Não houve o aditamento, houve uma multa módica [ao partido] de R$ 22,7 milhões.”

  • A campanha de Bolsonaro tentou “melar” as eleições:

“[Houve] a tentativa de melar as eleições na véspera – uma segunda-feira, o segundo turno era no domingo. Na segunda-feira, [a campanha] disse que 30 mil inserções de rádios de um dos candidatos tinham sido suprimidas, para o TSE determinar imediatamente o adiamento do segundo turno ou reposição das inserções. Um negócio patético, se não fosse agressivo à democracia.”

  • As suspeitas sobre urnas são fruto de “lavagem cerebral”:

“No fundo, ela [pessoa apoiadora de Bolsonaro] sabe que não tem fraude, que é um discurso, que foi uma lavagem cerebral. Tanto foi que, entre abstenção, voto nulo e voto em branco, somados, foi o menor número de pessoas das últimas 10 eleições, proporcionalmente. Em outras palavras: foi o maior número de votos em candidatos.”

  • Os golpistas envolvidos nos atos de 8 de janeiro sofreram com essa “lavagem cerebral”:

“Não é fácil tentar atentar contra a democracia. Essas pessoas que depredaram as sedes dos 3 poderes, […] eu fui ao presídio com a ministra Rosa Weber, várias alienadas, acham que não fizeram nada, acham que foram se manifestar. Uma delas disse que estava passando por perto e Deus disse para ela se refugiar debaixo da mesa do presidente do Senado e que por isso ela entrou. É um negócio assustador o que essa lavagem cerebral das milícias digitais está fazendo com inúmeras pessoas”.

  • Discursos criminosos nas redes sociais devem ser punidos:

“Não podemos cair na armadilha da extrema direita de achar que estamos regulando liberdade de expressão. Esta é a grande armadilha, o grande discurso e a narrativa que a extrema direita no mundo todo conseguiu construir. Tudo é ‘minha liberdade de expressão’. Isso foi pegando, as pessoas se sentiram à vontade para voltar a ser racistas, homofóbicas e nazistas. ‘Liberdade de expressão’. Pode no mundo real? […] Se pode no mundo real, pode aqui também. Não pode mundo real? É crime? É crime aqui também.”

  • Houve omissão das autoridades durante dos acampamentos golpistas em frente a quarteis:

“Foi um erro deixar na frente? Eu diria que, mais que um erro, foi uma omissão, que está sendo investigada. Infelizmente, não podia determinar, de ofício, a retirada. Foi dito: ‘Isso vai dar problema’. Mas vinham esvaziando, realmente. O grande temor era o dia da posse, e o dia da posse foi tranquilo e, depois, no dia 8 que está sendo apurado, todos viram o que aconteceu.” G1